Vamos voltar a conectar as crianças com o mundo real

Maio 2, 2024 às 12:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
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Artigo de opinião de Carlos Neto publicado na Sábado de 5 de abril de 2024.

São necessárias estratégias práticas e acessíveis que incentivem uma desconexão saudável, promovendo o bem-estar digital e por outro lado, o bem-estar psicológico e físico das crianças, essenciais para um crescimento equilibrado e harmonioso.

Estamos progressivamente a ser inundados de informação, encharcados de dispositivos digitais em todo o lado, mas por outro lado famintos de sabedoria. Vivemos o nosso corpo na ponta dos dedos, ao alcance de um botão, com acesso a uma conexão com todo o mundo cheio de coisas, acontecimentos, notícias e pessoas, mas acabamos por cultivar a solidão e uma cultura egocêntrica nas nossas existências. Os seres humanos foram capturados e manipulados de forma subtil, sem muitas vezes terem consciência de si, vivendo num tempo à pressa, sem capacidade de parar, refletir, pensar de forma critica, vida sem profundidade e baseada numa produtividade de sobrevivência e numa violência de pandemia digital. Estes estilos de vida dos adultos atingem as primeiras idades de forma inevitável, aumentando de forma muito significativa as percentagens de sedentarismo infantil com graves consequências para a sua saúde física e mental. O custo total dos problemas relacionados com a saúde mental é superior a 4% do PIB, ou seja, 600 milhões de euros por ano nos 27 países da EU. A percentagem de crianças e jovens que apresentam sintomas de depressão em Portugal e nos restantes países da EU, mais que duplicou durante e após a pandemia. Relativamente à obesidade infantil, prevê-se um crescimento de 3.5% ao ano, elevando a percentagem de crianças obesas para 24% em 2035. Notícias muito alarmantes para uma condição com uma muito estreita relação com doenças cardiovasculares, metabólicas e cancro (World Obesity Atlas, 2023). Segundo a indicação de relatórios recentes da Organização Mundial de Saúde, devemos definir e organizar soluções governativas para a atividade física para os próximos anos, e que passam por estratégias de prevenção da saúde pública, implicando a criação de sociedades ativas, sistemas ativos e ambientes e pessoas ativas. É urgente pôr os corpos a mexer de forma regular, sistemática e intencional, através do aumento de atividades motoras, lúdicas, desportivas e artísticas.

Numa era dominada pela tecnologia na vida quotidiana de crianças e jovens e as consequências que já se conhecem no desenvolvimento da sua saúde física e mental, interessa iniciar uma reflexão mais robusta sobre as melhores estratégias para as desconectar dessa dependência digital e ser possível maior equilíbrio com o mundo real. A informação do contexto digital é por princípio externa, distante, solitária, artificial, imposta e sedutora, enquanto a vivência do contexto real (natural) é espontânea (brincar ou jogar), livre e autónoma, através de um corpo ativo, em contacto físico, social e em confronto com o risco no espaço natural ou construído. Estas crescentes preocupações com o impacto da exposição digital prolongada no desenvolvimento infantil, enfatiza a importância de reintegrar as crianças no mundo físico, através de atividades formais e não formais com intencionalidade educativa e terapêutica que fomentem a criatividade, a socialização e o contacto com a natureza. Muitas destas crianças e jovens andam perdidas num mundo virtual ao qual lhes foi dado acesso demasiado cedo e sem controlo.

Reconhecendo os desafios que pais e educadores enfrentam para equilibrar a vida digital e vida real das crianças, são necessárias estratégias práticas e acessíveis que incentivem uma desconexão saudável, promovendo o bem-estar digital e por outro lado, o bem-estar psicológico e físico das crianças, essenciais para um crescimento equilibrado e harmonioso. Importa refletir sobre as nossas práticas digitais e redescobrir os benefícios de um tempo offline na construção de uma infância rica e plena de diversidade de experiências em diversos contextos. Para implementar este objetivo, considera-se como ação prioritária a promoção da consciência digital das famílias e o estabelecimento de regras com a participação das crianças e jovens sobre a necessidade de estabelecer uma gestão do tempo, implementando zonas livres de tecnologia, de forma que as crianças possam experienciar atividades fora do ambiente digital, estimulando de forma mais natural e espontânea, permitindo um desenvolvimento motor, cognitivo, emocional e social de forma mais saudável. Esta mudança de hábitos de vida diária, implicará o fomento de momentos relacionais de grande imaginação, fantasia e criatividade, através da oferta de atividades offline de grande motivação e entusiasmo, que permitam experiências e vivências com diversos materiais, equipamentos em contexto familiar, escolar e comunitário. Todos sabemos, que não é uma tarefa fácil retirar os ecrãs às crianças pelo potencial poderoso de narrativas simbólicas poderosas e criadoras fáceis de dinâmicas viciadoras e de dependência digital. É mais difícil desligar do que ligar estes dispositivos de lazer e também de divertimento. Implementar momentos offline entre pais e filhos, implica a tomada de consciência critica, relação afetiva fortalecida, regras partilhadas de forma clara, coragem de romper com um estilo de vida sedentário e perceção dos benefícios que este consenso comum tem no aumento da qualidade de vida pata todos. Talvez a melhor estratégia seja começar com atividades simples: brincar e jogar em diversas formas de cultura lúdica em casa, passear em torno da habitação, na rua e na cidade, ir a um espaço de jogo público, viajar até a uma floresta, jardim público, visitar um museu, ou espaços para atividades especificas como pescar, andar de bicicleta, correr ou patinar, etc.

Outro aspeto que merece uma referência especial, centra-se no preconceito de que pais que dão liberdade para que os seus filhos tenham autorização de deslocação autónoma sem vigilância adulta, ser considerado como um comportamento negligente. Pais corajosos, que tomam estas decisões de dar autonomia aos seus filhos para conhecer, vivenciar e experimentar os espaços próximos e espaços progressivamente mais distantes, são aqueles que não deixaram morrer as suas memórias de infância e que não se deixam influenciar por medos sociais e culturais e apresentam níveis de confiança sobre a distanciação dos seus filhos e nos ganhos que essas atitudes podem oferecer em termos de confronto com situações inabituais e capacidade adaptativa. Na realidade, o ser humano deve confrontar-se com situações adversas, para se superar, socializar e adquirir níveis de maturidade adequados à sua idade e condição de desenvolvimento. São conhecidos imensos casos de pais que foram presos ou considerados negligentes por permitirem que os seus filhos pudessem caminhar e brincar livremente, nos espaços exteriores de jogo, na rua próximo de casa ou nos bairros próximos da sua habitação. Há evidências científicas claras e robustas que o brincar ao ar livre não supervisionado apresenta muitos benefícios nas crianças, principalmente em contacto com a natureza. Também se sabe que as crianças passam hoje menos tempo ao ar livre que os seus pais. Muitos pais, inexplicavelmente, também pensam que permitir que as crianças brinquem sozinhas deve ser um crime. Esta situação paradoxal de posicionamento parental, de ausência de autonomia nas primeiras idades é uma das variáveis responsáveis da existência de muitas dificuldades de aquisição de habilidades pessoais e sociais de crianças e jovens do nosso tempo. Não existem mais perigos do que no passado. Apenas temos mais automóveis e uma urbanização pouco amiga das crianças e dos jovens. É urgente fazer uma reflexão sobre estas questões relacionadas com a educação patológica de segurança e alterar os estilos de intervenção parental para a atribuição de uma mobilidade autónoma e sem supervisão. É fácil entregar um filho ao telemóvel. Dá menos trabalho do que conversar, ouvir, brincar, conectar. Mas essa “facilidade” tem custos. O corpo em movimento num mundo tecnológico é aparentemente contraditório, mas com um futuro muito promissor em termos de complementaridade.

Necessitamos de libertar as crianças e jovens de narrativas de vida de aprisionamento corporal e de impossibilidade de descobrir a vida real. Em síntese, libertar as crianças e jovens através do brincar e ser ativo, implica:

1-Estarem menos tempo sentadas, quietas e dependentes dos dispositivos digitais lúdicos;

2-Poderem brincar de forma livre e não supervisionados;

3-Terem mais oportunidades de se confrontarem com o risco físico, emocional mental e social no espaço público e em contacto com a natureza;

4-Estarem libertos de agendas muito estruturadas e formatadas;

5-Libertar as formas de superproteção parental excessiva;

6-Terem mais tempo de autonomia e mobilidade autónoma;

7-Terem mais direito a formas de participação em relação aos seus interesses e motivações pessoais;

8-Libertar e espantar os medos dos adultos;

9-Aumentar a literacia motora, lúdica, desportiva e artística.

O Brincar Arriscado: um direito das crianças – Carlos Neto

Fevereiro 22, 2024 às 12:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
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Artigo de Carlos Neto, publicado na revista Sábado de 17 de fevereiro de 2024.

Quanto mais a criança se confronta com o risco mais adquire nível de segurança. A educação, perceção e controlo do risco só é possível através de confronto com situações arriscadas entre o corpo e o envolvimento físico construído e natural.

O brincar é um comportamento fundamental e insubstituível na vida humana e principalmente na infância. É uma ferramenta ancestral, uma linguagem universal independentemente da cultura ou da situação geográfica. Brincar é um direito internacionalmente consagrado na Declaração Universal dos Direitos da Criança (20 de novembro de 1959) e na Adoção pela Assembleia Geral das Nações Unidas da Convenção dos Direitos das Crianças no seu artº 31 (20 de novembro de 1989). Através do brincar de forma livre e não estruturada, as crianças adquirem experiências com o imprevisto, o imprevisível e o incerto. O brincar vem de dentro, brotando imaginação e fantasia como um tempo próprio de ser criança. Por conveniência adulta, este tipo de comportamento é por vezes negligenciado, silenciado, bloqueado e maltratado, por ser considerado perda de tempo, um mero passatempo, não produtivo e secundário. As vantagens no seu desenvolvimento são muito significativas: capacidade de adaptação, cultura de sobrevivência, confronto com situações adversas, regulação emocional, autoconfiança, relação social e competências motoras, cognitivas e sociais.

De entre muitas dimensões do brincar nas primeiras idades, gostaríamos de destacar as atividades lúdicas que implicam risco (Risk Play). Todos os animais, incluindo os humanos correm riscos na infância. Para adquirir a posição de pé e iniciar a marcha e a corrida, a criança necessitou de cair imensas vezes. É uma condição biológica inerente ao nosso desenvolvimento psicomotor. A vida exige confronto com o risco. Não existe risco zero. Quanto mais a criança se confronta com o risco mais adquire nível de segurança. A educação, perceção e controlo do risco só é possível através de confronto com situações arriscadas entre o corpo e o envolvimento físico construído e natural. A evidência científica tem vindo a demonstrar nos últimos anos, uma decadência enorme como as crianças se confrontam com situações de risco, principalmente físico-motor, no contexto familiar, escolar e comunitário. A superproteção adulta, por vezes patológica e a pandemia do medo que se instalou em todo o lado, referente a uma cultura social adversa a crianças em contextos de risco, tem vindo a desenvolver as taxas de sedentarismo infantil (inatividade física, níveis baixos de competências motoras, obesidade, etc.), diminuição de autonomia de mobilidade, contato com a natureza, e aumento da ansiedade, stress e imaturidade. Trata-se de um problema de saúde pública (física e mental), que implica a implementação de políticas públicas sobre o planeamento dos espaços escolares (naturalizados e humanizados) e espaços públicos urbanos (espaços e equipamentos com valor lúdico e de risco) que valorizem a sedução para uma mobilidade ativa mais verde e promotora da convivência social para todas as idades. É urgente libertar as crianças do aprisionamento a que estão sujeitas nas últimas décadas, para viverem a sua infância de forma plena. A infância só se vive uma vez e não é repetível. As crianças nas primeiras idades, deveriam confrontar-se com o brincar arriscado (com supervisão adequada), através de desafios de grandes alturas (saltar, trepar, escalada, etc.), grandes velocidades (escorregar, corridas, bicicleta, skate, etc.), ferramentas perigosas (machados, facas, canivetes, serras, martelos, pregos, cordas, etc.), elementos perigosos (fogo, água, etc.) desaparecer e esconder (escondidas, locais secretos, etc.), e luta e perseguição (apanhada, toca e foge, luta a brincar, etc.).  Não é aceitável que se proíbam as crianças nos espaços escolares e na comunidade, de poderem subir às árvores, jogar à bola, fazer brincadeiras e jogos típicos da sua idade, fazer rodas, pinos à parede, etc. O corpo não deve ser formatado e policiado para estar sentado, quieto, em silêncio e obediente a aprender sem entusiasmo e curiosidade saberes numa escola tradicional, replicativa e conservadora. As crianças necessitam de expandir as suas energias naturais em situações de superação, aventura, risco e socialização. Recentemente a Sociedade de Pediatria do Canadá, recomendou aos seus pediatras, novas diretrizes a favor da implementação do jogo arriscado, sem supervisão adulta ou de modo muito limitado, considerando as vantagens para a saúde física e mental. As brincadeiras arriscadas permitem que as crianças tenham mais controle das suas atividades e sejam convidadas a ultrapassar os seus limites, com muitos benefícios na gestão de situações de incerteza. Estas formas de ação, não resultam em lesões muito graves ou fatais: joelhos esfolados ou, na pior das hipóteses, um braço quebrado não é assim tão catastrófico na vida de uma criança. Em outubro de 2021, foi publicado um artigo muito interessante no Jornal “The Guardien “, sobre os Espaços de Jogo Exteriores Públicos (parques infantis) na Alemanha e a posição dos “Designers” sobre a conceção novos modelos de espaços e equipamentos, mais ousados e como uma nova política para aumentar o risco nas brincadeiras das crianças, propondo uma retificação nas Normas Europeias existentes.

Os adultos cuidadores deveriam compreender melhor o significado e benefícios do brincar arriscado no desenvolvimento das crianças dos nossos dias, considerando a complexidade da nossa existência ancestral e a evolução dos modos de vida atuais. O mundo mudou rapidamente e a incerteza quanto ao nosso tempo também. Não há tempo para pensar o tempo das coisas do nosso corpo, da relação com os outros, do mundo que nos rodeia. A pressa em vivenciar tudo e a frustração de não conquistar nada. Perdemos o rumo da ética, da democracia, da consciência crítica da essência de ser, em oposição a uma valorização de uma aparência superficial e não na profundidade. Perdidos e vadios na velocidade de querer um domínio ditatorial de nós próprios num regime formatado de aparente democracia que se impõe sem ter a perceção do aprisionamento a que somos sujeitos por interesses alheios à conquista da nossa autonomia e liberdade. Talvez possamos regularmente subir às árvores, como deviam fazer as crianças, para reabilitar a nossa capacidade de contemplar o corpo lá do alto, perante a complexidade da nossa história evolutiva e a tragédia ecológica que está a danificar todos os dias o nosso planeta. Talvez o milagre (remédio/receita) para curar todos os males da humanidade, passe por voltar a ter a vontade de brincar para buscar o prazer da descoberta de existir, porque são essas energias que nos conduzem ao risco, aos limites, para se aprender a viver melhor, através da motivação intrínseca, controlo interno e suspensão da realidade. Subir às árvores como um sonho, inspiração divina, proximidade da morte (simbólica), e ter a iluminação de reabilitar o mundo (familiar, escolar, de saúde, do trabalho, do afeto, da empatia e da comunidade) para um paradigma revolucionário de convivência com o nosso corpo, os outros e o mundo que nos rodeia. Subamos todos às árvores por vários momentos para entender o que deveríamos ser, fazer e sentir na educação das nossas crianças.

“O mundo mudou, a Escola tem de mudar”

Agosto 13, 2022 às 4:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
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diarioalentejo

Notícia do Diário de Alentejo de 22 de julho de 2022.

Carlos Neto, professor Catedrático da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa, em entrevista ao “Diário do Alentejo”

Um dos convidados da sessão de apresentação dos resultados do programa educativo +Sucesso Educativo no Baixo Alentejo foi Carlos Neto, considerado um dos maiores especialistas mundiais na área da brincadeira e do jogo no desenvolvimento das crianças.

Texto José Serrano

Qual a principal mensagem que pretendeu transmitir nesta sua intervenção, em Beja?

A principal mensagem é que o mundo mudou e a Escola tem de mudar. Provavelmente, teremos de fazer a construção de um novo paradigma do que é o funcionamento, a organização da escola, através de um pacto de sustentabilidade entre a instituição escolar, a família e a comunidade. Para tal, há que trabalhar em conjunto, no sentido de se alcançar uma nova forma de compreender o funcionamento da escola, a maneira como é entendida a aprendizagem das crianças e dos jovens e, acima de tudo, perceber que as crianças têm de ter um maior equilíbrio entre atividades formais e atividades informais.

Na prática, o que significa a necessidade de equilíbrio entre esses dois tipos de atividades, formais e informais?

Significa que as crianças têm currículos intensos e extensos, que se tem de dar mais valor ao corpo, à atividade física – isto é, corpos ativos e a brincar muito dão cérebros ativos, através de emoções e sentimentos – esta é, também, uma forma fundamental de aprendizagem. Não há muito tempo, no século passado, havia duas escolas: a formal e a “escola da rua”, onde, na nossa infância, fazíamos grandes aprendizagens. Hoje, essa “escola da rua” desapareceu ou está em vias de extinção. Temos uma excessiva dimensão de ocupação do espaço público, uma urbanização desenfreada com uma intensidade de mobilidade automóvel enorme. As crianças não podem, de facto, andar lá fora, não podem brincar na rua, não podem encontrar amigos. As crianças não vão a pé para a escola, não mexem o corpo – e isso é essencial para se aprender.

Essa mudança de paradigma, de que fala, é essencial para a “escola do futuro”?

Hoje, a escola só está preocupada com a escolarização – médias, testes – para os alunos entrarem na universidade. Enquanto não mudarmos esta visão não é possível termos uma escola virada para o futuro, que é desconhecido, incerto e imprevisível. É necessário uma escola em que se aprendam coisas fundamentais, em que as crianças são protagonistas, porque participam no próprio processo de aprendizagem. Por isso temos de nos interrogar o que é que o futuro e temos de reinventar a Escola, na perspetiva de preparar os alunos com capacidade de adaptação e com capacidade criativa.

De que forma novas metodologias de educação, nomeadamente através de atividades lúdicas, poderão contribuir, determinantemente, para o aumento do sucesso escolar?

Nós não podemos visualizar o sucesso escolar baseado apenas em modelos clássicos de entender o processo educativo. Temos de dar mais valorização às atividades artísticas, às atividades físicas. As crianças têm de ter a capacidade de serem pequenos exploradores, cientistas, artistas, vivendo as suas próprias aprendizagens, sendo elas as protagonistas da própria ação de aprender. E os professores terão que ser verdadeiros especialistas a construir contextos interessantes, desafiantes, para que as crianças aprendam em função dos seus talentos, das suas capacidades pessoais.

Como classifica o projeto +Sucesso Educativo no Baixo Alentejo, na sua capacidade de atingir a ideia que lhe está subjacente, de combate ao insucesso escolar, na região?

Estes projetos, relacionados com a Cimbal, são fundamentais no apoio à escolaridade e no apoio ao sucesso escolar educativo, auxiliando as crianças que têm mais dificuldades, ajudando as famílias – esta relação entre as autarquias e as escolas é algo muito importante, eu diria mesmo fundamental. Obviamente que, paralelamente, é essencial que este tipo de projetos educativos sejam acompanhados por outras mudanças, que têm de existir do ponto de vista, por exemplo, da legislação laboral, para que os pais tenham mais tempo para estar com os filhos. Nos 27 países que fazem parte da Comunidade Europeia, nós assistimos a grandes assimetrias na disponibilidade temporal dos pais para estarem com os filhos e na, consequente, qualidade de vida.

Quer com isso dizer que as crianças passam demasiado tempo na escola, pouco tempo com os pais?

Nós não podemos entender como é que as crianças portuguesas passam na escola, no ensino pré-escolar e no primeiro ciclo, 50 horas semanais, com atividades organizadas de manhã à noite. As crianças têm de ter tempo para estar em família para conhecer a aldeia, a vila, a cidade onde moram. Para terem conhecimento do território, para terem contacto com a natureza, para se confrontarem com riscos. E isso não está a acontecer. As nossas crianças estão a ficar muito imaturas, por não terem as experiências básicas da infância, fundamentais para haver autoestima, autoconfiança, controle emocional, resiliência. Por conseguinte, há uma fragilidade enorme e isso implica que muitas vezes, as crianças tenham insucesso escolar.

Brincar, sair à rua, é essencial?

Brincar muito na infância, vivenciar o corpo, de forma adequada, é uma experiencia fundamental. Tem a ver com a nossa cultura biológica, ancestral, relativa à capacidade de adaptação, de crescer de forma harmoniosa. E isso não está a acontecer. As crianças estão prisioneiras, cativas, muitas horas, em casa e na escola. Nesse âmbito, surgiu recentemente um novo fator que é a sedução digital – as crianças ficam imenso tempo, completamente hipnotizadas em frente aos ecrãs. É preciso ter muito cuidado com isso.

Que medidas considera serem urgentes implementar, para que o novo paradigma de Escola contemporânea, de que fala, possa surgir em Portugal?

Políticas educativas mais abertas, mais democráticas, mais participativas. Iniciarmos um novo processo de contrato social para a educação, sendo capazes de trabalhar juntos, significando isso a capacidade de ter modelos organizativos ensino/ /aprendizagem centrados em perspetivas de trabalho transversais, em que as crianças possam participar na sua própria construção e na ação.

 

TPC Férias de Verão

Julho 13, 2022 às 8:00 pm | Publicado em Divulgação | Deixe um comentário
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Imagem retirada daqui

Em vez de automóveis, carros de rolamentos: ruas de Lisboa fechadas ao trânsito e devolvidas às crianças

Janeiro 20, 2022 às 8:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
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mensagem

Reportagem da Mensagem de Lisboa de 31 de maio de 2021.

A escola não tem de acabar no recreio. Foi com isto em mente que o projeto Brincapé decidiu fechar ruas da cidade aos carros, uma vez por semana, durante duas horas, para dar às crianças a provar a infância dos pais e avós. Por momentos, a cidade nem soa à mesma.

Cristiano Ronaldo lembrá-lo-á como se de ontem se tratasse. Os dias em que conheceu os golos de futebol nas ruas do Funchal, onde passava a maioria dos seus dias. Da rua, nasceram aqueles que reconhecemos hoje como audazes quer no futebol, quer no basquetebol – os desportos-mor das ruas e dos parques das grandes e pequenas cidades. E quem sabe se a rua também não deu à luz mentes brilhantes na engenharia, depois de uma criança construir um carrinho de rolamentos. Ou um artista urbano, enquanto saltava os muros velhos e desbotados e viu ali a tela para imprimir a sua arte.

“Já lá vai o tempo”, dirão as gerações mais velhas. O tempo em que brincar podia ser na liberdade de uma rua. Mas as ruas já não são livres. São, na sua maioria, dos carros e, ao contrário de antigamente, agora são as crianças que têm de pedir licença para entrar.

Mas há uma iniciativa que está a mudar Lisboa como a conhecemos até agora, todas as sextas-feiras. Uma vez por semana, durante duas horas, as ruas fecham-se ao trânsito e o projeto Brincapé, financiado pelo BIP/ZIP, abre-as às crianças.

O início do fim da utopia

São 17 horas da tarde e a vista do Panteão Nacional é a que nunca fora: na rua em frente, os únicos carros que vemos estão estacionados na berma há largas horas ou não têm rodas e descem a estrada de calçada portuguesa contra uma torre de pneus. São caixas de refrigerantes ou águas, geralmente apenas avistadas na restauração e supermercados, e que agora se transformam num meio de transporte para estas dezenas de crianças que vão chegando e fazendo dos materiais à sua disposição o que a imaginação exigir. Cordas, panos, mais pneus, garrafas. Se as caixas não chegam para todos, outros arriscam-se a saltar e trepar muros. Ou árvores – pelo menos uma criança olhou a árvore como um desafio.

O som é outro também. No lugar dos motores, há agora gritos e risadas juvenis. Daqui, quase diríamos que a cidade foi dominada por elas, as crianças, tornando-se num grande recreio.

No final da escadaria do Panteão, está Andrea Sozzi – um homem de 43 anos, italiano há vários anos residente em Lisboa -, em conversa com outros pais que por ali esperam o final das brincadeiras dos filhos. O seu pequeno Tazio, de oito anos, frequenta o CAF (Componente de Apoio à Família) na Escola Básica do Convento do Desagravo e, em passagem por aqui, acabou por ficar e juntar-se a outras crianças. “Eu não sei o que é isto”, confessa o pai Andrea. Explicamos e dá a boa nova ao filho, que responde prontamente: “Ah. Deve ser mau para os carros. Mas é bom para mim.” Ri-se, enquanto desce a escadaria pelo muro que a ladeia, como nunca o tinha feito.

Tazio, como todas as crianças aqui presentes, está a aprender a brincar de uma outra forma: com a estrada inteira pela frente.

“A escola não tem de estar fechada dentro da escola.” Di-lo Liliana Madureira, coordenadora do projeto Brincapé, que resulta de uma parceria entre a APSI e o Macaquinho do Xinês. Está vestida de t-shirt branca com o logótipo, tal como toda a equipa presente, e com um olhar sempre atento ao que acontece à volta. É assim que justifica a origem desta iniciativa que hoje traz a escola para a rua. “A escola é a instituição que colhe a educação, mas não é uma prisão. A escola pode sair cá para fora, quando aquilo que educa está cá fora. E se o recreio não tem tudo o que precisava de ter, podemos vir procurar à rua. Ou porque temos um parque fantástico cá fora, ou porque temos um evento, ou porque há dinâmica de bicicletas.”

Mas, cá fora, o que os mais novos encontram não são atividades planeadas nem brinquedos predefinidos para determinada função – a não ser um carro de rolamentos já construído pela equipa do Brincapé. “Nada foi comprado”, tudo foi reciclado. E, na maioria das vezes, “o fim que os pais idealizam para uma caixa não é o fim que lhe acabam por dar”. Como diz Liliana Madureira, “há uma exploração muito mais livre dos materiais”, aqueles que a equipa leva para o terreno e aqueles que a própria natureza lhes dá.

Sobre a ideia que gerou estes recreios em plenas ruas de Lisboa – um mês em cada uma diferente -, a coordenadora da iniciativa explica que estes “são projetos de ignição, de mudança”, para provar que a palavra “utopia” não entra aqui. “Ainda agora estava a falar com uma pessoa sobre isto. Isto são ideias que parecem utopias. ‘Ah, isso é uma utopia. Acho eu’, disse-me. E quando há o ‘acho eu’ a gente percebe: será mesmo uma utopia?”

Para que deixe de ser, diz, “temos de estar predispostos para a mudança, que implica errar e avaliar o nosso erro e criar mudança novamente”. Um processo “mais desgastante” e que só não acontece porque, “muitas das vezes, as pessoas estão tão dentro das suas rotinas que não têm tempo para pensar numa alternativa a elas”.

Fala das famílias, mas também das escolas. “Quando chegamos com estas loucuras, os pais fazem imensas questões e, ainda assim, desconfiam – há sempre o receio relativamente à segurança. E é por se estar tão preocupado com o que os pais pensam que pode acontecer – que nem nós sabemos o que é -, que, por via da dúvida, não arriscamos, não fazemos diferente e continuamos no mesmo.”

A pensar nas brincadeiras que poderia fazer nesta rua, António, de dez anos, mal tinha dormido na noite anterior. “Sonhou a noite toda com isto”, conta a mãe, Maria Galamba, 52 anos, que ergue o telemóvel para registar todos os momentos. Por detrás do ecrã, ela sorri e faz adivinhar o que, depois, acabou por confessar. “Só não estou ali, porque tenho duas hérnias nas costas.” Vê ali um regresso à sua infância, em Serpa, no Alentejo, altura e sítio em que brincar na rua não era sequer questionável.

“Aqui, ele acaba por participar em coisas em que nunca pensou participar. Passamos aqui todos os dias e ele brinca com coisas que nunca pensou utilizar de outra maneira, como o que está a fazer agora.” Desde que chegou, António desce a calçada, enterrado numa caixa de plástico azul, em direção ao fim da rua. “Acho que se devia alargar a toda a cidade. Dá outra alegria, o barulho da felicidade dos miúdos. É uma coisa única, um privilégio. É um alvoroço saudável.”

A rua é insegura?

Antes de o Brincapé o ser, nasceu o “Siga a Pé”, em 2017, ambos pela mão da APSI – Associação Para a Promoção da Segurança Infantil. A ideia? Criar uma espécie de autocarro humano, de casa para a escola. “Muitas vezes, os pais até vêm todos do mesmo sítio, mas vêm todos até à escola, para trazer a sua criança” e a vasta maioria vai de carro. “Percebemos que eram raros os miúdos que vinham a pé e, quando vinham, raríssimos os que vinham sozinhos”, diz Liliana Madureira.

Pôs-se a questão aos pais: por que razão escolhem ir de carro? Porque as ruas são inseguras, não hesitaram em responder. “E perguntámos: qual é a grande insegurança. Eles disseram que são os carros. Então, eles estão a trazer esta insegurança para a porta da escola? É um contrassenso. Quando lhes colocamos isto assim, eles ficam: ‘ah, pois é’.” E nasceu a proposta do autocarro humano, que antes da pandemia já tinha rotas ativas. “Escusa o pai ou a mãe de ter de andar a correr, a pressionar as crianças para vir para a escola, e elas conversam, brincam, andam a pé, criam relações de vizinhança.”

Mas o medo dos graúdos perante os seus filhos persiste, até na hora de deixar que as crianças brinquem numa única rua fechada. José Morgado, especialista em pedagogia e psicologia infantil, lembra que a grande ameaça está no sedentarismo. “Temos índices preocupantes de obesidade infantil e de diabetes II em crianças. Brincar ao ar livre tem um papel muito importante ao nível do desenvolvimento.” A nível físico, cognitivo e até de saúde.

Diz o especialista que, “hoje, temos um discurso altamente protetor dos miúdos e depois, paradoxalmente, somos dos países da Europa com maior número de acidentes com crianças”. “O que é estranho”, acrescenta, “porque os próprios pediatras prescrevem a brincadeira, o mexer na relva, na lama, que diminui os riscos que agora os miúdos desenvolvem facilmente – as alergias”.

No âmbito cognitivo do desenvolvimento infantil, brincar tendo o céu como teto é o caminho obrigatório para uma maior autonomia, como explica. “A definição que eu acho mais bonita sobre educar não é retirada dos livros de psicologia, é do Almada Negreiros, e diz que ‘educar é ajudar alguém a tomar conta de si próprio’. E o brincar na rua é uma ferramenta de promoção disto mesmo. O que eu quero é que os meus alunos ou filhos sejam autónomos e hoje são muito pouco autónomos. Desde que são pequenos que tomamos decisões por ele e depois queremos que eles sejam autónomos. Ao brincar na rua, aprendemos a controlar os riscos.”

A mudança, diz, começa na cultura dos pais, mas também na legislação. Diz-nos que a lei permite que as crianças de dez anos possam despender de até 11 horas na escola. “Os miúdos são recolhidos cheios de sono ao final da tarde e depois, no meio de um banho, de uma novela e de um jantar é que existe educação. E o brincar entra onde?”, lança o repto.

O clima não deverá ser desculpa, “porque no Norte da Europa as crianças brincam muito mais na rua e o clima é mais agreste do que o nosso”. Mas os carros ainda são.

Por isso, para cada nova atividade do Brincapé a burocracia é requisito. A coordenadora do projeto conta que, para cada fecho de rua, é necessário um pedido de licenciamento de corte de estrada à autarquia, que depois dita as condições: normalmente, solicitam controlo policial para que não se ponha em causa a segurança das crianças e um agente presente para controlar o trânsito – na necessidade de terem de arrancar carros já estacionados antes da atividade ou de passagem de veículos de emergência.

Um processo que, na opinião de Liliana Madureira, deveria ter caminho facilitado. Exorta exemplos: “como moradores de uma rua, deveríamos ter a liberdade de dizer: ‘não, hoje aqui não passam carros, hoje vamos fazer uma festa da comunidade’. E se aqui há uma escola, esta rua também é das crianças. Então, elas deveriam ter a liberdade e autoridade de dizerem que querem que esta rua sirva para a sua brincadeira. Mas não têm, quem tem autoridade nas ruas são os carros.”

Apesar da burocracia, a ideia que parecia utópica está, na sua perspetiva, já longe de o ser. Sobre a possibilidade de ganhar ruas exclusivas para as crianças, mesmo que em permanência num só dia da semana, a coordenadora do Brincapé mostra-se otimista: “essa discussão já começa a existir”.

Não é Lisboa o primeiro município português a ser “Cidade das Crianças”

Lá fora, o conceito não é novo. Há décadas que Francesco Tonucci, um pedagogo italiano e autor do livro “A Cidade das Crianças” – “La Città dei Bambini” -, defende que construir uma pode mesmo ser uma utopia, mas que há caminho para o alcançar e deve ser percorrido. A ideia corre mundo, partiu de Roma e gerou uma rede de centenas de cidades interessadas em aderir aos ideais de uma cidade pensada para as suas crianças. Este ano, Valongo, um município do distrito do Porto, sagra-se como o primeiro município português a oficializar a entrada nesta rede que visa envolver os mais pequenos nas decisões sobre o território.

A experiência chama-se “Valongo 4.0” e deverá arrancar já em setembro, com a criação de um Conselho da Criança, para o qual são sorteadas crianças com nove ou dez anos, residentes no concelho, que irão debater sobre uma revisão do Plano Diretor Municipal. Aquilo a que o presidente da Câmara Municipal de Valongo chama de “laboratório comunitário”.

José Manuel Ribeiro diz que ainda não estão definidas verbas para a iniciativa, à espera do que surgir desta discussão entre crianças. Mas assume que o caminho deve passar por aquilo que Lisboa já experimenta a um nível micro e isolado: fechar ruas para as devolver às crianças.

Mais abaixo no mapa, Coimbra alberga também uma metodologia para incluir mais as crianças na cidade e trazê-las para o ar livre. Chama-se “Limites Invisíveis”, tem lugar na Mata do Choupal e é um projeto que pretende fomentar o contacto com a natureza, faça sol ou chuva – como nos países nórdicos. Em operação desde 2015, trabalham com crianças dos três aos dez anos, para lhes proporcionar um bem-estar imediato e a longo prazo, com benefícios acreditados nas suas capacidade sociais, emocionais, cognitivas e motoras.

Em Lisboa, o pequeno António de dez anos adormece a sonhar com mais uma sexta-feira a descer a calçada dentro de uma caixa azul. “Gostavas de ter sempre uma rua para brincar?”, perguntamos-lhe na despedida. António arregalou os olhos, como se daqui tivesse saído a melhor das ideias, e respondeu com toda a firmeza que a idade permite: “sim”.

 

Estudo mostra que crianças devem passar tempo sozinhas ao ar livre para criar laços com a Natureza

Setembro 9, 2020 às 8:00 pm | Publicado em Estudos sobre a Criança | Deixe um comentário
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Notícia do site ZAP aeiou de 16 de agosto de 2020.

Um novo estudo sugere que passar tempo sozinha ao ar livre, seja a pescar ou a explorar, pode ajudar uma criança a fortalecer os laços com a Mãe Natureza.

De acordo com o site Science Alert, a investigação mostra que os momentos solitários ao ar livre são importantes para as crianças, não só para se identificarem com a Natureza e se sentirem confortáveis nela, mas também porque estes laços irão inspirá-las a protegê-la quando forem mais velhas.

Claro, isto não significa necessariamente que os adultos não devam supervisionar as crianças para se certificar de que estão seguras. Mas o estudo indica que pode haver benefícios em recuar um pouco e observar as crianças na Natureza.

Os investigadores pediram a 1285 crianças da Carolina do Norte, Estados Unidos, com idades entre os nove e os 12 anos, para responderem a uma série de perguntas sobre o tempo que passam ao ar livre.

A equipa queria saber se estes jovens faziam atividades como caça, pesca, caminhadas, acampamentos ou desportos ao ar livre, e como é que se sentiam em relação ao mundo natural em geral. Sentiam-se confortáveis na natureza selvagem? Gostavam de estar cá fora? Já prestaram grande atenção às diferentes plantas e animais à sua volta?

“Vimos que havia diferentes combinações de atividades específicas que podem construir uma forte conexão com a Natureza, mas um ponto de partida fundamental foi estar ao ar livre, numa atividade mais solitária”, afirma Kathryn Stevenson, investigadora de educação ambiental do Departamento de Parques, Recreação e Gestão de Turismo da Universidade Estadual da Carolina do Norte.

Segundo o mesmo site, isto não quer dizer que o tempo ao ar livre com outras pessoas não seja importante – o estudo descobriu que interações sociais com colegas ou adultos podem reforçar os laços mais fortes com a natureza – mas ter algum tempo para refletir por nós mesmos pode ter um impacto maior na nossa infância do que imaginamos.

A investigadora, cujo estudo foi publicado, a 30 de julho, na revista científica The Journal of Environmental Education, também destaca que muitas pessoas “que seguem carreiras focadas no ambiente geralmente se lembram de experiências durante a infância que tiveram impacto nas suas vidas, como caminhar num determinado trilho ou explorar o riacho perto de casa”.

ZAP //

Brincar ao ar livre: “Há uma excessiva protecção das crianças que, no fundo, as limita”

Junho 12, 2019 às 12:00 pm | Publicado em Campanhas em Defesa dos Direitos da Criabnça, Relatório | Deixe um comentário
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Notícia do Público de 28 de maio de 2019.

De acordo com o relatório Playtime Matters, publicado pela organização Semble, 61% dos professores à escala mundial considera que brincar ao ar livre está relacionado com o bem-estar das crianças.

Teresa David

Subir e descer árvores, jogar à apanhada ou construir abrigos – há inúmeras brincadeiras que se podem fazer ao livre, mas poucas crianças o fazem. De acordo com o relatório Playtime Matterspublicado pela Semble, a uma escala global, 40% dos professores do 1.º ciclo do ensino básico afirmam que as crianças nas suas turmas têm menos de 30 minutos de recreio ao ar livre num dia normal de escola e 61% dos inquiridos considera que brincar ao ar livre tem uma relação directa com o bem-estar das crianças.

“O défice de atenção e a hiperactividade são doenças que estão a ser muito faladas e debatidas e há um número elevado de crianças que estão na escola e que estão sob o efeito de medicamentos”, diz Mónica Franco, uma das fundadoras do Movimento Bloom, uma associação ambiental sem fins lucrativos, que tem como objectivo ligar as crianças e as famílias à natureza. Segundo a mesma, “o ar livre tem essa capacidade de trabalhar com as crianças sem que elas estejam sob o efeito de nada”.

Há um ano, o Movimento Bloom criou a Escola da Floresta Bloom – um projecto que disponibiliza actividades para escolas e famílias e que pretende (re)ligar as crianças à natureza. De acordo com Mónica Franco, os professores que levam os seus alunos à Escola da Floresta, em Sintra, “ficam estupefactos com as diferenças que tem o facto de lhes ser dada a oportunidade de estar determinado tempo ao ar livre”, diz. “São crianças que depois têm um comportamento melhor e que melhora na sala de aula”, garante.

Estar na natureza e brincar de forma não estruturada, isto é, quando se permite que a criança descubra os objectos e o mundo à sua volta de forma livre, “é uma oportunidade de testarem os seus limites, de resolverem os seus problemas, os seus conflitos, de ultrapassarem as suas limitações e, portanto, contribui para aquilo que são chamadas as soft skills”, explica Mónica Franco. Esta forma de brincar pode também ajudar as crianças “na aprendizagem e a consolidar conhecimentos” já que tem benefícios para a “concentração, fomenta a sua criatividade, imaginação, para além de ser mais divertido”, conclui a representante da associação.

De acordo com o mesmo relatório, 80% dos professores questionados consideram que as crianças da sua escola deviam ter mais tempo para brincar ao ar livre. Apesar de as escolas permitirem os intervalos, “nem em todas as escolas esse intervalo é livre”, afirma a responsável. “As crianças, muitas vezes, não podem usufruir do recreio porque há falta de pessoal e não podem ir até determinadas zonas da escola, não podem subir às arvores. Há uma excessiva protecção das crianças que, no fundo, as limita” esclarece.

Não só os professores estão a impor mais restrições às crianças, mas também os pais. “Hoje em dia há um pavor: não se vê crianças a brincar na rua e mais, não se vê crianças a ser autónomas e a ir de bicicleta ou ir a pé para a escola ou apanhar um autocarro”, constata Mónica Franco que associa este factor à consequente perda de capacidades motoras.

Na opinião de Mónica Franco, os smartphones e outros gadgets electrónicos “limitam muito a criatividade” e retiram tempo à brincadeira, mas é também a intensidade com a que as crianças vivem nos dias de hoje que faz com que sobre pouco tempo para a brincadeira – “Os miúdos saem da escola, têm explicações, têm ATL, têm actividades depois da escola e acabam por chegar a casa com a vida tão estruturada que não há tempo para brincar”, disse.

A Associação Movimento Bloom, com o apoio da Associação Nacional de Professores, organiza em Portugal a campanha internacional “Dia de Aulas ao Ar Livre”, que considera que o tempo dedicado no exterior dentro do horário escolar é das iniciativas mais importantes para combater a crescente crise de problemas relacionados com a saúde mental das crianças e dos jovens. A campanha “tem como objectivo que as crianças tenham pelo menos 60 minutos diários de brincadeira não estruturada ao ar livre. Há muitas que não têm”, remata.

 

 

Não sobrecarregue os seus filhos com atividades (os especialistas explicam porquê)

Fevereiro 11, 2019 às 6:00 am | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
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Sérgio Condeço

Texto do Notícias Magazine de 10 de janeiro de 2019.

Da escola para o futebol, o piano, o inglês e muitas outras atividades, as crianças ficam demasiado ocupadas e sem tempo para terem liberdade, para desenvolverem a criatividade, para fazerem as suas próprias escolhas ou para brincarem. E brincar é oxigénio para os mais pequenos.

Texto Cláudia Pinto | Ilustração Sérgio Condeço/WHO

O tema é debatido recorrentemente e suscita dúvidas. As crianças estão demasiado ocupadas? Têm o tempo todo preenchido e sem alternativa para o que realmente importa para o seu desenvolvimento? Os especialistas acham que sim.

Como noutras áreas de comportamento, não existem fórmulas universais nem regras estanques. Maria José Araújo é professora da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico do Porto (IPP) e investiga esta área do brincar e do tempo livre há muitos anos.

“As crianças têm de ter oportunidade para brincar e divertir­‑se, visando os propósitos da sua educação e do seu bem­‑estar”, explica. E se na teoria isto é algo que se percebe, na prática, com a logística diária, vidas atarefadas, pais à beira de um ataque de nervos entre os afazeres familiares e profissionais diários, tudo se torna mais complexo. “As crianças dependem dos adultos, dos pais, dos educadores, não decidem sozinhas e ficam à espera que alguém lhes dê essa possibilidade”, sublinha.

Na maioria das vezes, só querem brincar. É a atividade que melhor conhecem desde tenra idade. Mas, no dia­‑a­‑dia, passam demasiado tempo na escola, chegando a ocupar os finais de tarde com atividades desportivas ou de complemento ao estudo. Resta pouca margem para dar largas à criatividade, tão importante no crescimento. “É fundamental que se perceba que brincar é como respirar para as crianças. Estas só aprendem porque brincam”, explica a professora.

Mas o que são afinal os tempos livres? Será que as atividades em que as crianças estão inscritas são consideradas como tal? Afinal, a sigla ATL sugere isso mesmo. Esta designação deve ser entendida como o tempo em que a criança pode dedicar a atividades não estruturadas.

“As estruturadas (inglês, guitarra, ginástica, etc.) são fundamentais para a aprendizagem, em termos intelectuais, sociais, físicos, mas nessas a criança não tem liberdade. Os tempos livres são essenciais para que aprenda a lidar com a frustração”, explica Catarina Mexia, psicóloga e terapeuta do casal no Centro de Estudos da Família e Psicoterapia.

Na incessante tentativa de ocuparmos os miúdos, nem sempre recuperamos hábitos mais simples que podem proporcionar verdadeiro tempo de qualidade em família, como fazer um bolo nas tardes frias de domingo. Sem complicar muito. Ou, pura e simplesmente, não fazer nada.

“As crianças não estão habituadas a parar. Não fazer nada é fazer alguma coisa. Para­‑se, respira­‑se, ou pura e simplesmente descansa­‑se”, sublinha a psicóloga. Não é incomum ouvi‑las comentar que não têm nada para fazer. Mas, afinal, “o tédio é fundamental para a criança descobrir coisas diferentes para fazer”, salienta a médica pediatra do Hospital dos Lusíadas Joana Appleton Figueira.

Além da importância de as crianças terem os seus tempos livres e de não estarem demasiado ocupadas, não é menos relevante deixá­‑las escolher em vez de serem os pais a fazê­‑lo.

“Estamos muito preocupados com a escola, temos uma sociedade hiperescolarizada, e isto não é errado. A escola é fundamental, mas no tempo curricular que está previsto na lei. Nas restantes horas, as crianças, que gostam de fazer muitas coisas, deveriam ter a oportunidade de escolher algumas das suas atividades”, defende Maria José Araújo, que, já em 2009, publicava um livro a alertar para esta realidade, intitulado Crianças Ocupadas, editado pela Prime Books.

Nas aulas que leciona, no IPP, dedica uma unidade curricular a esta questão e uma outra relacionada com a motricidade e o bem­‑estar, de forma a alertar os alunos de hoje, educadores de amanhã, para a valorização do tempo livre como algo essencial para a vida das crianças. O objetivo é formar futuros professores sobre a questão do brincar e da ocupação das crianças após o horário letivo.

Quando as atividades nem sempre correspondem ao que a criança deseja, acaba por ser frequente a desistência. É esse, aliás, um dos motivos que levam mais os pais a recorrer às consultas de Catarina Mexia. “A preocupação que aparece mais em consulta é o que se passa com os filhos, porque é que não persistem e desistem facilmente. A questão é que os pais não estão a ouvir os filhos”, alerta.

Estarão os pais e as escolas a programar o tempo das crianças de forma rígida e exagerada?

“As atividades organizadas são habitualmente propostas pelas instituições e escolhidas pelos pais. Os estudos provam que quando as crianças escolhem o que fazer, e os pais respeitam essa escolha, as crianças não se cansam tanto e usufruem em pleno”, explica Maria José Araújo.

Brincar implica correr, estar ao ar livre, interagir com os amigos e outras crianças. Isto nem sempre é possível em algumas escolas tradicionais. Algumas delas têm espaços condicionados, o que torna também o tempo de recreio mais limitativo.

“A música, a ginástica, o inglês e todas as atividades são realizadas em espaços fechados. As crianças passam de um espaço fechado para outro. No entanto, há muitas escolas e muitas instituições que têm muito cuidado e que fazem um espaço notável ao proporcionarem recreio ao ar livre, idas ao parque, organizam passeios, caminhadas, brincadeiras e jogos no exterior”, adianta a professora.

Por vezes, e porque os pais estão a trabalhar e não têm quem vá buscar os filhos à escola ao final do tempo de aulas, a brincadeira é substituída por “salas com poucas funcionárias para o número de crianças e com uma televisão para os manter quietos. Ou então, em ATL que são prolongamentos da escola, com salas semelhantes e onde se fazem trabalhos de casa”, sublinha Joana Appleton Figueira.

Na sociedade atual existe ainda uma enorme pressão com os resultados escolares, daí que se incentive o estudo. A típica frase: “Tens de ter boas notas para seres alguém na vida” é claramente identificada por cada um de nós. “As crianças já são ‘alguém’ no momento em que nascem. São pessoas de pleno direito. As preocupações dos pais são legítimas e levam‑nos a organizar as atividades que consideram que poderão vir a proporcionar mais oportunidades e um trabalho aos filhos no futuro. Queremos muito que as crianças sejam responsáveis, mas não desenvolvemos a sua responsabilidade e autonomia. Porque isso pressupõe que brinquem e o façam com os outros”, explica Maria José Araújo.

E se lhe disséssemos que a criança está a aprender enquanto o faz? “Brincar é a única forma que a criança tem de aprender quando é pequena, mesmo dentro de uma sala de aula”, acrescenta. Percebe­‑se então a quantidade de vezes em que os miúdos reforçam que querem brincar “só mais um bocadinho” e a insistência para que os adultos partilhem o momento.

Não existem receitas milagrosas nem números mágicos. O que pode ser o ideal para uma família, não tem de ser necessariamente para outra. “Para algumas crianças, principalmente as mais velhas, pode não haver muito tempo livre todos os dias, desde que, durante a semana, existam horas disponíveis para ler, conversar com a família e com os amigos. O tempo livre pode ser passado a ajudar os pais com o jantar sem tecnologias ligadas, enquanto conversam, e deve ser proporcionado diariamente às crianças mais novas, sem ecrãs, com poucos brinquedos acessíveis de cada vez (num quarto cheio, a criança nem consegue decidir com o que brincar)”, sugere Joana Appleton Figueira.

Mais do que a quantidade de atividades, o tempo deve ser passado com qualidade e, se possível, partilhado com os pais. Com alguma organização mas sem exageros. “Por vezes, é mais útil não programar tanto ao fim de semana e deixar acontecer”, conclui Catarina Mexia.

Leituras que ajudam

Numa sociedade contemporânea em que as pessoas estão cada vez mais ocupadas, sobra pouco tempo para se refletir sobre as melhores decisões que se podem (ou devem) tomar no dia­‑a­‑dia. No livro Crianças Ocupadas, a autora procura facultar aos pais um instrumento que lhes permita decidir o que é melhor para os seus filhos.

O quê?… Os adultos não sabem? é um livro que resulta de um trabalho incluído num projeto de educação criativa desenvolvido ao longo de três anos com crianças do 1.º ciclo do ensino básico da escola EBl/JI do Cerco do Porto (Agrupamento de Escolas do Cerco). As crianças tentam explicar, à sua maneira, que precisam que as deixem brincar.

 

Os quatro excessos da educação moderna que perturbam as crianças

Junho 14, 2017 às 6:00 am | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
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Texto do site http://www.revistapazes.com/ de 24 de maio de 2017.

Por Jennifer Delgado Suárez, psicóloga

Quando nossos avós eram pequenos, eles tinham apenas um casaco de frio para o inverno. Apenas um! Naquela época de vacas magras, já era luxo ter um. Exatamente por isso a criançada cuidava dele como se fosse um tesouro precioso. Naquela época bastava a consciência de se ter o mínimo indispensável. E, acima de tudo, as crianças tinham consciência do valor e da importância de suas coisas.

Muita água correu por baixo da ponte, acabamos nos transformando em pessoas mais sofisticadas. Agora prezamos pelas várias opções e queremos que nossos filhos tenham tudo aquilo que desejarem, ou, caso seja possível, muito mais. Não percebemos que esse mimo excessivo ajuda a criar um ambiente propício para transtornos psicológicos.

De fato, foi demonstrado que o excesso de estresse durante a infância aumenta a probabilidade de que as crianças venham a desenvolver problemas psicológicos. Assim, uma criança sistemática pode ser empurrada para ativar um comportamento obsessivo. Uma criança sonhadora, sempre com a cabeça nas nuvens, pode perder a sua capacidade de concentração.

Neste sentido, Kim Payne, professor e conselheiro norte-americano, conduziu uma experiência interessante em que simplificou a vida de crianças diagnosticadas com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade. Depois de apenas quatro meses, 68% destes pequeninos passaram a ser considerados clinicamente funcionais. Eles também mostraram um aumento de 37% em suas habilidades acadêmicas e cognitivas, um efeito que não poderia coincidir com a medicação prescrita para esta desordem, o Ritalin.

Estes resultados são, em parte, extremamente reveladores e, mais que isto, também são um pouco assustadores, porque nos fazem pensar se realmente estamos criando para nossos filhos um ambiente saudável, mental e emocionalmente.

O que estamos fazendo de errado e como podemos corrigir isto?

Quando o “muito” se transforma em “demais”?

No início de sua carreira, este professor trabalhou como voluntário em campos de refugiados, onde teve que lidar com crianças que sofrem de estresse pós-traumático. Payne constatou que essas crianças se mostravam nervosas, hiperativas e tremendamente ansiosas, como se pressentissem que algo de ruim fosse acontecer de uma hora para a outra. Elas também eram amedrontadas em excesso, temendo qualquer novidade, o desconhecido, como se tivessem perdido a curiosidade inata das crianças.

Anos mais tarde, Payne constatou que muitas das crianças que precisavam de sua ajuda mostravam os mesmos comportamentos que os pequenos que vinham de países em guerra. No entanto, o estranho é que estas crianças viviam na Inglaterra, abraçados por um ambiente completamente seguro. Qual a razão que os levava a exibir os sintomas típicos de estresse das crianças pós-traumáticas?

O professor pensa que as crianças em nossa sociedade, apesar de estarem seguras do ponto de vista físico, mentalmente vivem em um ambiente semelhante ao produzido em áreas de conflito armado, como se suas vidas estivessem sempre em perigo. A exposição à muitos estímulos provoca um estresse acumulado que obriga as crianças a desenvolverem estratégias que as façam se sentir mais seguras.

Na verdade, as crianças de hoje estão expostas a um fluxo constante de informações que não são capazes de processar. Elas são forçadas ao crescimento rápido, já que os adultos depositam muitas expectativas sobre elas, forçando-as a assumir papéis que realmente não condizem com a realidade infantil. Assim, o cérebro imaturo das crianças é incapaz de acompanhar o ritmo imposto pela nova educação, por conseguinte, um grande estresse ocorre, com as óbvias consequências negativas.

Os quatro pilares do excesso.

Como pais, nós normalmente queremos dar o melhor para os nossos filhos. E pensamos que, se o pouco é bom, o mais só pode ser melhor. Portanto, vamos implementar um modelo de paternidade superprotetora, nós forçamos os filhos a participar de uma infinidade de atividades que, em teoria, ajudam a preparar os pequenos para a vida.

Como se isso não fosse suficiente, nós enchemos seus quartos com livros, dispositivos e brinquedos. Na verdade, estima-se que as crianças ocidentais possuem, em média, 150 brinquedos. É demais, e quando é excessivo, as crianças ficam sobrecarregadas. Como resultado, elas brincam superficialmente, facilmente perdendo o interesse imediatista nos brinquedos e no ambiente, elas não são estimuladas a desenvolver a imaginação.

Payne ressalta que estes são os quatro pilares do excesso que forma a educação atual das crianças:

1 – Excesso de coisas.

2 – Excesso de opções.

3 – Excesso de informações.

4 – Excesso de rapidez.

Quando as crianças estão sobrecarregadas, elas não têm tempo para explorar, refletir e liberar tensões diárias. Muitas opções acabam corroendo sua liberdade e roubam a chance de se cansar, o que é elemento essencial no estímulo à criatividade e ao aprendizado pela descoberta.

Gradualmente, a sociedade foi corroendo as qualidades que tornam o período da infância algo mágico, tanto que alguns psicólogos se referem a esse fenômeno como a “guerra contra a infância”. Basta pensar que, nas últimas duas décadas, as crianças perderam uma média de 12 horas por semana de tempo livre. Mesmo as escolas e jardins de infância assumiram uma orientação mais acadêmica.

No entanto, um estudo realizado na Universidade do Texas revelou que quando as crianças brincam com esportes bem estruturados, elas se tornam adultos menos criativos, em comparação com jovens que tiveram mais tempo livre para criar suas próprias brincadeiras. Na verdade, os psicólogos têm notado que a maneira moderna de jogar gera ansiedade e depressão. Obviamente, não é apenas o jogo mais ou menos estruturado, mas também a falta de tempo.

Simplificar a infância.

A melhor maneira de proteger a infância das crianças é dizer “não” para as diretrizes que a sociedade pretende impor. É preciso deixar que as crianças sejam crianças, apenas isso. A melhor maneira de proteger o equilíbrio mental e emocional é educar as crianças na simplicidade. Para isso, é necessário:

– Não encher elas de atividades extracurriculares, que, em longo prazo, não vão ajudá-las em nada. – Deixe-lhes tempo livre para brincar, de preferência com outras crianças, ou com jogos que estimulem a criatividade, jogos não estruturados.

– Passar um tempo de qualidade com eles é o melhor presente que os pais podem dar.

– Criar um espaço tranquilo em suas vidas onde eles podem se refugiar do caos e aliviar o estresse diário.

– Garantir tempo suficiente de sono e descanso.

– Reduzir a quantidade de informações, certificando-se de que esta seja sempre compreensível e adequada à sua idade, o que envolve um uso mais racional da tecnologia.

– Simplifique o ambiente, apostando em menos brinquedos e certificando-se de que estes realmente estimulem a fantasia da criança.

– Reduzir as expectativas sobre o desempenho, deixe que elas sejam simplesmente crianças. Lembre-se que as crianças têm uma vida inteira pela frente até se tornarem adultos, entretanto, então, permita que elas vivam plenamente a infância.

Texto publicado em espanhol no site Rincón de la Psicología, traduzido e adaptado pela Revista Pazes.

 

 

 

Por que brincar livremente é a melhor escola de verão

Julho 29, 2015 às 8:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social, Estudos sobre a Criança | Deixe um comentário
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Texto da revista http://www.theatlantic.com de 20 de junho de 2014.

Jessica Lahey

Why Free Play Is the Best Summer School

Jessica Lahey

The more time children spend in structured, parent-guided activities, the worse their ability to work productively towards self-directed goals.

Most schools across the nation have marked the end of another academic year, and it’s time for summer. Time for kids to bolt for the schoolhouse doors for two long months of play, to explore their neighborhoods and discover the mysteries, treasures, and dramas they have to offer. This childhood idyll will hold true for some children, but for many kids, the coming of summer signals little more than a seasonal shift from one set of scheduled, adult-supervised lessons and activities to another.

Unscheduled, unsupervised, playtime is one of the most valuable educational opportunities we give our children. It is fertile ground; the place where children strengthen social bonds, build emotional maturity, develop cognitive skills, and shore up their physical health. The value of free play,  daydreaming, risk-taking, and independent discovery have been much in the news this year, and a new study by psychologists at the University of Colorado reveals just how important these activities are in the development of children’s executive functioning.

Executive function is a broad term for cognitive skills such as organization, long-term planning, self-regulation, task initiation, and the ability to switch between activities. It is a vital part of school preparedness and has long been accepted as a powerful predictor of academic performance and other positive life outcomes such as health and wealth. The focus of this study is “self-directed executive function,” or the ability to generate personal goals and determine how to achieve them on a practical level. The power of self-direction is an underrated and invaluable skill that allows students to act productively in order to achieve their own goals.

The authors studied the schedules and play habits of 70 six-year-old children, measuring how much time each of them spent in “less structured,” spontaneous activities such as imaginative play and self-selected reading and “structured” activities organized and supervised by adults, such as lessons, sports practice, community service and homework. They found that children who engage in more free play have more highly developed self-directed executive function. The opposite was also true: The more time kids spent in structured activities, the worse their sense of self-directed control. It’s worth noting that when classifying activities as “less structured” or “structured,” the authors deemed all child-initiated activities as “less-structured,” while all adult-led activities were “structured.”

All of this is in keeping with the findings of Boston College psychology professor Peter Gray, who studies the benefits of play in human development. In his book Free to Learn: Why Unleashing the Instinct to Play Will Make Our Children Happier, More Self-Reliant, and Better Students for Life, he elaborates on how play supports the development of executive function, and particularly self-directed control:

Free play is nature’s means of teaching children that they are not helpless. In play, away from adults, children really do have control and can practice asserting it. In free play, children learn to make their own decisions, solve their own problems, create and abide by rules, and get along with others as equals rather than as obedient or rebellious subordinates.

When we reduce the amount of free playtime in American preschools and kindergartens, our children stand to lose more than an opportunity to play house and cops and robbers. Some elementary programs recognize the importance of play and protect its role in preschool and kindergarten. Montessori schools and Tools of the Mind curricula are designed to capitalize on the benefits of self-directed free play and student-initiated activities. Tools of the Mind programs, for example, place even more importance on developing executive function than on academic skills. In their terminology, “self-regulation” is the key to success both in school and in life:

Kindergarten teachers rank self-regulation as the most important competency for school readiness; at the same time, these teachers report that many of their students come to school with low levels of self-regulation. There is evidence that early self-regulation levels have a stronger association with school readiness than do IQ or entry-level reading or math skills, and they are closely associated with later academic achievement.

This is not news to most teachers, who, when tasked with educating increasingly crowded classrooms, hope and pray for students with well-developed executive function. The ability to self-direct can spell the difference between an independent student, who can be relied upon to get her work done while chaos reigns around her, and a dependent, aimless student, who is distracted by his classmates and must be guided from one task to the next.

Parents, if you really want to give your kid a head start on coming school year, relinquish some of that time you have earmarked for lessons or sports camp and let your children play. That’s it. Just play. Grant them time free from your ulterior motives and carefully planned educational outcomes. Let them have dominion over their imaginary kingdoms while their evil dragons, white wizards, marauding armies, and grand battles for supremacy unfurl according to their whims and wills.

 

 

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