Meninas de um, dois e três anos foram postas num centro de acolhimento e, mais tarde, dadas para adoção. Segurança Social e tribunais não fizeram tudo para “assegurar a manutenção da relação familiar”.
O Estado português foi condenado a pagar 13 mil euros de indemnização a uma família de Vendas Novas, em Évora, por ter institucionalizado três dos seus filhos e, mais tarde, tê-los colocado em situação de adoção. A decisão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), conhecida nesta terça-feira, obriga ainda Portugal a pagar 6150 euros de despesas que a família suportou com os processos judiciais.
Para os juízes europeus, a Segurança Social e os tribunais portugueses “ignoraram as suas obrigações de assegurar a manutenção da relação familiar” entre pais e as filhas. Alegaram também que a decisão de colocar as crianças em situação de adoção “não se baseou em fundamentos suficientes para a justificar” e, portanto, não foi uma medida “proporcional ao objetivo” que se pretendia alcançar.
Meninas nunca regressaram a casa
O caso remonta a outubro de 2007, quando a Segurança Social retirou três meninas de um, dois e três anos aos pais e colocou-as num centro de acolhimento em Évora, a mais de 50 quilómetros de distância da casa da família. A medida foi, então, justificada com situações de descuido observadas no seio do agregado familiar.
No mês seguinte, a mãe, Piedade Manteigas, e o companheiro assinaram um acordo de proteção, no qual se comprometeram a resolver as lacunas identificadas pelas técnicas sociais. O compromisso foi ratificado pelo Tribunal de Montemor-o-Novo e a família passou a beneficiar de habitação social e Rendimento Social de Inserção, apoio financeiro que perdeu quando o pai das crianças arranjou emprego a ganhar o salário mínimo nacional.
Até dezembro de 2011, mãe e pai viram as crianças no primeiro domingo de cada mês, quando se deslocavam ao centro de acolhimento, e nunca obtiveram autorização para que as meninas regressassem a casa, nem para um curto período de férias. E, no verão de 2012, o Tribunal de Montemor-o-Novo retirou a autoridade parental a Piedade Manteigas e ao companheiro e entregou as três raparigas para adoção.
Segundo o juiz, “não houve qualquer melhoria na situação familiar” e as próprias crianças confessaram não querer voltar a viver com os pais. Esta justificação seria ratificada pelo Tribunal da Relação de Évora, em julho de 2013 e, no ano seguinte, o Supremo Tribunal de Justiça indeferiu o recurso apresentado pelos pais.
Pais demonstraram afeto pelos filhos
O caso avançou para o TEDH que, nesta terça-feira, deu como provado que “as visitas [dos pais] ao centro de acolhimento foram restringidas” e que o Tribunal de Montemor-o-Novo “não acedeu a nenhum dos pedidos feitos pela mãe e pelo seu parceiro para obter autorização para as suas filhas passarem férias na casa da família”.
“Além disso, o tribunal nunca considerou aplicar uma medida de proteção menos restritiva, apesar de a situação material da família ter melhorado”, lê-se no acórdão. Para os juízes europeus, “esta situação contribuiu para o gradual afastamento da mãe das suas filhas e para o facto consumado da rutura dos laços familiares entre elas”.
Por outro lado, o TEDH refere que a decisão de retirar as crianças à família baseou-se, fundamentalmente, “na indigência” dos pais e na “sua dependência da assistência social”. “Embora seja verdade que, em alguns dos casos declarados inadmissíveis pelo tribunal, a colocação das crianças foi motivada por condições de vida insatisfatórias ou privação material, esta nunca foi a única razão para a decisão dos tribunais nacionais: a isto juntaram-se outros fatores, tais como o estado psicológico dos pais ou a sua incapacidade emocional, educacional e pedagógica”, acrescenta o TEDH.
Contudo, neste caso, “em nenhuma fase do processo foram mencionadas situações de violência, maus tratos ou abuso sexual” das meninas e “os tribunais também não encontraram quaisquer deficiências emocionais”. Pelo contrário, reconheceram que mãe e pai “demonstraram grande afeto pelos seus filhos”.