Meios de comunicação social e identificação de crianças envolvidas em processos judiciais

Agosto 15, 2019 às 12:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
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Artigo de opinião de Ana Paula Pinto Lourenço de publicado no site Advogar de 19 de abril de 2016.

Por Ana Paula Pinto Lourenço

A exposição mediática resultante da identificação directa ou indirecta das crianças e jovens envolvidos em processos administrativos ou judiciais, viola, frequentemente, os direitos e dignidade dos visados, com prejuízo para o seu bem-estar e harmonioso desenvolvimento.

Esta violação é tão mais relevante quanto é certo que a técnica, através do armazenamento de dados e da facilidade do seu acesso, possibilita a revisitação ad nauseam dos conteúdos escritos e audiovisuais, perpetuando os danos que possam advir dessa exposição. Essa ideia foi enfatizada em 2010 por Alfredo Maia, à data Presidente do Sindicato dos Jornalistas, ao afirmar que “os rostos, os nomes, as identidades concretas das pessoas que são notícia têm futuros” e “os actos geram resultados e produzem consequências nas vidas das pessoas”, enfatizando deste modo a responsabilidade subjacente às escolhas jornalísticas, cujos efeitos podem projectar-se para o futuro.

Sendo verdade que num Estado de Direito, como afirmava Kant, “toda a pretensão jurídica deve possuir a possibilidade de ser publicada”, certo é que o conflito de direitos de igual valência constitucional – nomeadamente, da liberdade de expressão, de informação e de criação constitucionalmente reconhecidos à imprensa, por um lado, e o direito à imagem e à intimidade da vida privada, por outro – pode obrigar a restrições à publicidade, nomeadamente ao direito de assistência a actos processuais, ou ao de narração dos seus termos, bem como da divulgação de dados das pessoas envolvidas. Tal é o caso dos processos relativos a crianças e jovens, devendo neste caso toda a actividade ser norteada pelo princípio do superior interesse da criança.

A criança carece de protecção acrescida em virtude de se encontrar em processo de maturação intelectual e moral, pelo que, nos termos da norma superior, à criança é garantido o direito à protecção da sociedade e do Estado com vista ao seu desenvolvimento integral, nalguns casos, inclusivamente, contra a vontade dos detentores da responsabilidade parental ou de quem tenha a criança a seu cargo.

Também por essa razão devem os jornalistas rodear-se de cuidados acrescidos quando tenham de noticiar aquele tipo de factos. Tal como afirmou Armando Leandro numa entrevista ao Observatório de Deontologia do Jornalismo, “noticiar factos sobre crianças exige uma ética de cuidado”.

Em termos gerais, o Código Civil confere protecção genérica à personalidade contra ofensas ilícitas ou ameaça de ofensas à personalidade física ou moral do indivíduo, proibindo a exposição, reprodução ou introdução no comércio do retrato de uma pessoa sem o seu consentimento.

Algumas organizações profissionais internacionais promoveram a elaboração de manuais sobre a ética na relação com a justiça, de que é exemplo o manual Putting Children in the Right, da International Federation of Journalists, elaborado com o apoio da Comissão Europeia. O mesmo aconteceu em Portugal antes da entrada em vigor do Estatuto do Jornalista, com a celebração de acordos de auto-regulação e co-regulação como o Código Deontológico dos Jornalistas ou a Plataforma Comum dos Conteúdos Informativos nos Meios de Comunicação, com bases expressas de protecção da imagem e identidade de crianças e jovens em determinados contextos.

Ao impor genericamente carácter reservado ao processo, a Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo proíbe expressamente à comunicação social a identificação de crianças e jovens em perigo, bem como a de sons ou imagens que permitam essa identificação, norma extensível aos processos tutelares cíveis, por força do n.º 2 do artigo 33.º da Lei n.º 141/2015, de 8 de Setembro, que estabelece o Regime Geral do Processo Tutelar Cível.

A identificação, directa ou indirecta, das vítimas de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual e das vítimas de crimes contra a reserva da vida privada, até ao limite temporal da audiência de julgamento, ou para além dela nos casos de menores de 16 anos, também resulta expressamente do artigo 3.º da Lei da Imprensa, preceito complementado pelo artigo 88.º do Código de Processo Penal que, impondo o segredo, apenas permite a sua divulgação conquanto exista consentimento expresso da vítima. Cabendo aos pais, ou responsáveis pela criança, suprir a falta de capacidade dos filhos, cabe-lhes decidir em que contexto aquelas captação e divulgação podem ser efectuadas, embora nem sempre o seu consentimento deva ser considerado. Nesse mesmo sentido se pronunciou o Tribunal da Relação de Lisboa, ao considerar irrelevante o consentimento dos pais e condenando uma operadora de televisão ao pagamento de uma indemnização por ter entrevistado uma vítima de um crime contra a autodeterminação sexual, menor de 10 anos idade, com a cara oculta, mas identificável pela voz por quem conhecesse a criança. Na reportagem, foram entrevistados igualmente familiares da criança.

Embora a Lei Tutelar Educativa (LTE) consagre o princípio geral da publicidade das audiências e das decisões, e considerando os interesses de protecção e a necessidade de inserção social a que os instrumentos internacionais constantemente se referem – cf., por exemplo, as Regras de Pequim – permite que, ope judicis, oficiosamente ou a requerimento, seja impedida a comunicação social de proceder à narração ou reprodução de certos actos ou peças do processo, bem como à divulgação da identidade do menor.

A violação do atrás preceituado fará incorrer num crime de desobediência, crime público, pelo que bastará, para sancionamento dessas condutas, o conhecimento pelo Ministério Público.

A possibilidade de divulgar a identidade, excepto quando proibido, não tutela eficazmente o superior interesse da criança e intriduz entropia no sistema, uma vez que a LTE permite o que o Estatuto dos Jornalistas, na redacção introduzida pela Lei 64/2007, de 6 de Novembro (e, por conseguinte, ulterior à LTE), proíbe, estabelecendo como infracção disciplinar identificar os menores que tiverem sido objecto de medidas tutelares sancionatórias. Este regime não é satisfatório, devendo considerar-se a proibição de divulgação de dados pessoais durante todo o processo, sob pena de perder o efeito útil, permitindo a divulgação de elementos durante o processo, proibindo a divulgação numa fase em que os elementos fossem já públicos.

Para maior protecção, deveria ser proibida a divulgação da identidade durante todo o processo, anonimizando-se a decisão, quando facultada, eliminando todos os elementos que permitam a identificação dos envolvidos: nome, filiação, residência, escola que frequente, entre outros. Operação a que, de resto, se procede, seja quem forem os intervenientes e seja qual seja o tipo de processo, quando se publica a decisão nas páginas oficiais dos tribunais e da DGSI.

De todo o modo, para cumprir o dever de informar dos meios de comunicação social e o direito à informação comunitária, parece bastar o simples relato dos factos, substituindo por nomes fictícios, desde que esse facto seja expressamente assinalado no texto, encontrando-se ilustrações alternativas à exibição da imagem da crianças ou outras que permitam a sua identificação.

Face ao exposto, não se compreendem, nem a constante violação do direito à imagem e à reserva da intimidade da vida privada das crianças e jovens por quem está legal e estatutariamente obrigado a respeitá-los, nem a inércia de quem deveria sancionar tão acintosas violações.

Actuar de modo a dignificar a criança e o jovem e a garantir o seu desenvolvimento harmonioso exigirá, por parte dos media, a modificação de metodologias e a definição de novas estratégias, de modo a satisfazer os seus interesses e os interesses da comunidade sem infringir a lei, porquanto o respeito pelos direito da criança constitui um imperativo simultaneamente ético e legal que não pode ser desconsiderado por nenhum outro critério, seja de que natureza for.

Em paralelo, exigirá uma intervenção mais atenta do Ministério Público, desde logo quando exista desobediência relativamente a decisões que imponham o segredo, da Entidade Reguladora da Comunicação Social e da Comissão da Carteira Profissional dos Jornalistas, bem como uma mais adequada formação da comunidade civil e jurídica, para que sejam sentinelas na detecção de situações a merecer a intervenção daquelas entidades e agentes da salvaguarda daqueles direitos. Porque o tempo das crianças não é o tempo dos adultos, e enquanto paramos para pensar em soluções, o futuro das crianças já passou.

Para qualquer sugestão ou crítica: ap.pintolourenco@gmail.com

Direito da Família : Vária : Jurisdição da Família e das Crianças – e-book do CEJ

Outubro 26, 2018 às 8:00 pm | Publicado em Estudos sobre a Criança, Livros | Deixe um comentário
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Descarregar o e-book no link:

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Audição da Criança : Guia de Boas Práticas

Fevereiro 8, 2018 às 8:00 pm | Publicado em Livros | Deixe um comentário
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descarregar o guia no link:

Click to access Audicao-Crianca-Guia-Boas-Praticas.pdf

Pais vão poder definir online o poder parental da criança

Junho 5, 2017 às 12:00 pm | Publicado em Divulgação | Deixe um comentário
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Notícia do https://www.publico.pt/ de 2 de junho de 2017.

alteração pode beneficiar 18 mil pais e 15 mil crianças PAULO PIMENTA

Medida publicada nesta sexta-feira em Diário da República faz parte do Simplex+. Cartão de cidadão gratuito para pessoas carenciadas também vai ser mais fácil de obter.

As 33 medidas do pacote Simplex+ devem ficar concluídas nesta sexta-feira. Uma das propostas diz respeito aos pais separados que, se estiverem de acordo, vão poder definir online o poder parental da criança – o que inclui os dias e horas de visita ou o valor da prestação de alimentos, avança o Diário de Notícias.

A esmagadora maioria das medidas dizem respeito ao Ministério da Justiça, com um total de 25 ideias incluídas no Simplex+. Das duas alterações publicadas nesta sexta-feira em Diário da República, explica o mesmo jornal, uma delas prevê a possibilidade de os processos de regulação do poder paternal passarem a contar com uma comunicação electrónica e imediata entre as conservatórias e o Ministério Público (MP).

Assim, sempre que os pais estejam de acordo, o processo será desmaterializado. O magistrado tem 30 dias para dar luz verde ao acordo, ou devolver o processo com eventuais pedidos de esclarecimento ou alterações. O acordo é depois homologado pelo conservador e tem o mesmo valor de uma sentença judicial.

Questões como os dias e horas de visitas, o valor da prestação de alimentos ou a fixação da residência do menor em casos de regulação do poder paternal poderão ser definidos online, com o registo civil a remeter a informação para os tribunais. O Ministério da Justiça estima que a medida abranja 8845 processos, num total de 18 mil pais e 15 mil crianças. Esta ideia do Simplex+ terá também impacto nos custos: menos três horas de trabalho dos funcionários judiciais do Ministério Público e menos dez folhas de papel por processo, o que no global ultrapassa as 88 mil folhas.

As conservatórias do Registo Civil passaram, em Abril, a ser responsáveis pela regulação dos poderes paternais também em casos de casais unidos de facto que se queiram separar. Antes só tinham competência para os casos de casais divorciados, evitando que as crianças fossem a tribunal, excepto em caso de dúvidas.

Uma outra medida deste Simplex+ diz respeito ao cartão de cidadão atribuído de forma gratuita a pessoas carenciadas, diz também o Diário de Notícias. Haverá uma ligação directa entre o Instituto de Registos e Notariado e a Segurança Social. Até aqui, o cidadão tinha de esperar pela correspondência física entre si e ambos os serviços para fazer prova dos baixos rendimentos. Todos os anos são pedidos 26.881 cartões para cidadãos carenciados, o que representa um custo de 400 mil euros.

A medida citada na notícia é a seguinte:

Portaria n.º 188/2017 de 2 de junho

 

 

II Congresso Lusobrasileiro Alienação Parental -Novos Horizontes, nos dias 23 e 14 janeiro, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

Janeiro 11, 2017 às 12:00 pm | Publicado em Divulgação | Deixe um comentário
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mais informações no link:

http://www.oa.pt/cd/Conteudos/Artigos/detalhe_artigo.aspx?sidc=31634&idc=32038&ida=150678

Conferência “Audição da Criança em Tribunal” e lançamento do livro ilustrado – 3 novembro no ISCTE

Outubro 25, 2016 às 8:00 pm | Publicado em Divulgação, Livros | Deixe um comentário
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Entrada gratuita sujeita a inscrição prévia

mais informações no link:

http://www.oa.pt/cd/Conteudos/Artigos/detalhe_artigo.aspx?sidc=31634&idc=32038&ida=150099

O (des)acordo dos pais na vida escolar dos filhos

Outubro 2, 2016 às 1:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
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Artigo de opinião de Sofia Vaz Pardal e Teresa Silva Tavares publicado no https://www.publico.pt/ de 8 de setembro de 2016.

A escolha do percurso escolar dos filhos, pelo impacto que tem na sua vida futura, terá que ser efectuada de comum acordo por ambos os pais.

A definição do rumo escolar dos filhos traduz-se num dos pilares da sua educação, pelo que a escolaridade não se pode/deve limitar a garantir a aprendizagem comportando, antes, um desafio de preparação para um futuro, com mais e melhores ferramentas, sendo de grande responsabilidade as escolhas que os pais são chamados a fazer neste âmbito.

A escolha do percurso escolar dos filhos, pelo impacto que tem na sua vida futura, terá que ser efetuada de comum acordo por ambos os pais.

Quando não existe consenso na decisão a tomar, pode ser necessário recorrer a tribunal, para resolver os diferendos agudos.

A lei determina que os pais têm que estar de acordo nas decisões sobre questões de particular importância na vida dos filhos.

Não existe, do ponto de vista legal, uma posição uniforme, na doutrina e na jurisprudência, quanto à classificação, como questões de particular importância na vida dos filhos, das situações relacionadas com a escolha da escola, matrícula, mudança de escola, etc.

Há quem entenda que a matrícula, em escola privada, respeita a uma questão de particular importância e quem defenda que a matrícula, em escola pública, respeita a um ato da vida corrente e, outros, que entendem que a escolha, entre ensino público ou privado, é sempre uma questão de particular importância e que, por isso, tem que ser decidida, por acordo, entre os pais.

Também há quem considere que a matrícula de um filho é um ato de particular importância na vida deste se respeitar ao seu futuro profissional, pelo contrário, se se tratar de inscrição em ensino obrigatório, já respeita a um ato da sua vida corrente, não exigindo o acordo dos pais.

Numa visão mais homogénea, há ainda quem defenda que todas as situações relativas à escola e à formação do filho, correspondem a questões de particular importância.

Assumindo que se trata de uma questão de particular importância que requer o acordo de ambos, quando os pais não conseguem chegar a uma decisão conjunta e, porque a vida dos filhos não pode ficar suspensa, deve tal situação de desacordo ser desbloqueada.

Uma mãe ou um pai, que se encontre numa situação destas e, vendo que a manutenção do conflito pode prejudicar a vida escolar do seu filho, deve recorrer ao tribunal, confiando ao juiz a tarefa de resolver a desavença.

O progenitor que recorra ao tribunal terá que indicar, de forma clara e objetiva, as razões, que o opõem às razões do outro progenitor, caraterizando a situação de desacordo que existe. (artigo 44.º n.º 1 da Lei n.º 141/2015, de 8 de setembro, que aprovou o Regime Geral do Processo Tutelar Cível).

A intervenção do tribunal é, inicialmente, mediadora, procurando o juiz obter, junto dos pais, o acordo que faltou. Será, marcada, para o efeito, uma conferência de pais, na qual o tribunal tentará pôr termo à desavença, conciliando as posições antagónicas dos pais, obtendo-se uma decisão que defenda o menor. Não o conseguindo, o juiz pode decidir provisoriamente a questão, devendo, em determinadas circunstâncias, ouvir o menor (artigos 35.º, 37.º e 38.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível).

A decisão provisória carecerá de se tornar definitiva, sendo a decisão judicial proferida, norteada pelo superior interesse do menor.

Por vezes, sucede que o pedido de intervenção do tribunal é feito já numa altura em que timings são apertados, pois, existe um calendário escolar rígido que não se altera porque os pais não se entendem e porque corre um processo em tribunal.

Não raramente, um dos progenitores procura prolongar a negociação com o outro só para ganhar tempo e retirar margem de manobra, sabendo que, quanto mais tempo decorrer, menos probabilidade existirá de o outro poder fazer valer a sua opinião, constrangendo, também, o recurso, a tribunal.

Para garantir o efeito útil da decisão do tribunal, prevê a lei que, correm durante as férias judiciais, os processos cuja demora possa causar prejuízo aos interesses do menor, pelo que este pedido – o de o processo correr em férias judiciais – deve ser ponderado no binómio intervenção do tribunal-calendário escolar devendo, ainda, tal pedido ser devidamente fundamentado (artigo 13.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível).

A educação dos filhos é um direito de ambos os pais mas, acima de tudo, um dever que, ambos os pais, têm perante os filhos.

O percurso escolar dos filhos, enquanto parte da educação destes, não deve ter que ser imposto, tendo a intervenção judicial caráter excecional, na medida em que o acordo entre os pais, é o modo principal (e desejável) de exercício das responsabilidades parentais, sendo estes corresponsáveis, nas matérias relativas às questões de particular importância na vida dos filhos, pelo que, de forma salutar e positiva, devem procurar – e encontrar – os consensos necessários, no interesse dos seus filhos, que são sempre o elo mais fraco em guerras judiciais ou em guerrilhas de pais.

Os filhos precisam dos pais e precisam de pais que possam dialogar entre si sobre decisões que têm que tomar sobre eles.

Guerra e guerrilha são caminhos de desgaste e de empobrecimento, que os filhos não merecem, pelo que o recurso a tribunal deve ser ponderado e decidido, de forma madura e responsável e reduzido aos casos em que tal intervenção se mostre indispensável para proteger os filhos.

Advogadas, svp@raassocidados.pt, tst@raassociados.PT

 

Crianças já podem ter advogado para decidir se ficam com a mãe ou com o pai

Fevereiro 18, 2016 às 1:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
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Notícia do Diário de Notícias de 17 de fevereiro de 2016.

Nuno Pinto Fernandes Global Imagens

 Filipa Ambrósio de Sousa

Com 12 anos, Dinis, filho de Bárbara Guimarães e Manuel Maria Carrilho, é o primeiro a pedi-lo

As crianças portuguesas maiores de 12 anos podem ter um advogado a representá-las num processo de regulação de poder paternal. Pela primeira vez, um menor terá um advogado próprio num caso deste género. Em causa está um pedido de Dinis Maria Carrilho, filho mais velho do ex-ministro Manuel Maria Carrilho e da apresentadora da SIC Bárbara Guimarães. A criança de 12 anos terá expressado a vontade ao pai, o que levou o advogado de Carrilho a fazer um requerimento à juíza do Tribunal de Família e Menores de Lisboa nesse sentido.

A possibilidade de uma criança, com pelo menos 12 anos, pedir um advogado que defenda os seus interesses em casos de regulação de poder paternal passou a ser permitida em outubro, com a entrada em vigor da Lei Tutelar Cível. Na verdade, existe desde 2014, ano em que Portugal ratificou as convenções de Estrasburgo (1996) e da ONU (1989), embora esse direito não fosse usado.

O regime atual permite a constituição de um advogado para a criança, autónomo dos advogados dos pais, em casos que os interesses dos seus pais e da criança estejam em conflito e quando a criança o solicitar expressamente ao tribunal. O advogado será pago pelo Estado, como defensor oficioso.

O DN falou com uma psicóloga infantil, Madalena Vaz, que admitiu que “esta é uma regra que tem sido esquecida mas que é fundamental para o equilíbrio da criança”. Um magistrado de família e menores, que pediu o anonimato, explicou que concorda em absoluto com um advogado em casos conflituosos entre as partes mas admite que “talvez a nossa lei processual não esteja adaptada para que existam três partes processuais distintas. Mas é uma questão de pensar nisso”, rematou.

A própria Ordem dos Advogados (OA) está a fazer esforços no sentido de relembrar que este mecanismo existe e deve ser usado. O Conselho Regional de Lisboa tem promovido desde outubro de 2015 ações de formação sobre o novo Regime Geral do Processo Tutelar Cível, com destaque para duas conferências de um dia e um dia e meio realizadas em novembro e janeiro com advogados e magistrados.

“Uma das novidades é, efetivamente, a possibilidade conferida ao menor de se fazer representar por advogado, solução que é de aplaudir. Quantas vezes o interesse do menor tem sido postergado pelos próprios pais que, envolvidos num conflito cego e interminável, esquecem o que é verdadeiramente relevante”, explica António Jaime Martins, líder regional de Lisboa da OA.

“Estando a representação dos menores entregue ao Ministério Público, a escassez destes magistrados para fazer face ao elevado número de pendências não tem sido a melhor solução para tutelar o interesse dos menores. Um Estado de direito democrático que se preze tem um especial dever de cuidar de quem muitas das vezes não tem voz nos tribunais”, conclui.

No caso concreto, o pedido foi feito por Dinis ao pai, Manuel Maria Carrilho, que terá transmitido a vontade do filho ao seu advogado, Nuno Gonçalves da Cunha. O DN sabe que o advogado entregou o requerimento na quinta-feira passada e a decisão está agora nas mãos da magistrada do Tribunal de Família e Menores de Lisboa, onde corre o processo de alteração de regulação do poder paternal. A criança terá indicado o nome de Rui Alves Pereira, sócio da PLMJ, a maior sociedade de advogados portuguesa, fundada por José Miguel Júdice.

Contactado pelo DN, o advogado sublinhou o facto de não conhecer nem Bárbara Guimarães nem Manuel Maria Carrilho. “Se porventura o meu nome, como refere, está a ser veiculado como advogado da criança, essa é uma questão que deve ser apreciada pelo tribunal. Não tenho mais nada acrescentar”, explicou o especialista em direito da família e presidente da Associação A Voz da Criança.

O mesmo advogado disse ser apologista da audição das crianças nestes casos e de essas mesmas crianças terem um advogado “mediante determinados requisitos, conforme resulta dos instrumentos internacionais e agora do novo regime jurídico do processo tutelar cível”.

Sublinhou ainda que não se revê na cultura de “posse” dos pais: “Seria bom que todos tivessem conhecimento das diretrizes do comité de ministros do Conselho da Europa de 17 de novembro de 2010 sobre a justiça adaptada às crianças.” Trata-se de mecanismos que defendem o direito das crianças a estar individualmente representadas por um advogado nos processos em que haja, ou possa haver, um conflito de interesses entre a criança e os pais ou outras partes.

O advogado de Manuel Maria Carrilho, Nuno Gonçalves da Cunha, confirma que fez esse pedido e concorda que as crianças sejam ouvidas e defendidas autonomamente neste tipo de processos. No entanto, não quis acrescentar mais informação.

 

 

 

 


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