Nuno e Alberto contam como é ser olímpico da Matemática
Junho 7, 2016 às 12:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentárioEtiquetas: Alberto Cavaleiro Pacheco, Ensino da Matemática, Matemática, Nuno Arala, Olimpíadas Internacionais de Matemática
texto do site Educare de 23 de maio de 2016.
Sara R. Oliveira
Têm várias medalhas nas olimpíadas nacionais e internacionais de Matemática. Gostam da disciplina, treinam, resolvem problemas e destacam-se entre os melhores dos melhores. Esforço e dedicação são essenciais nesta caminhada.
Nuno Arala tem vários prémios: quatro medalhas de ouro e uma medalha de prata nas Olimpíadas Nacionais de Matemática, uma menção honrosa nas Olimpíadas da CPLP, uma medalha de prata nas Olimpíadas Iberoamericanas, duas medalhas de bronze e uma menção honrosa nas olimpíadas internacionais, três medalhas de ouro e uma medalha de prata nas Olimpíadas Paulistas e ainda uma medalha de bronze nas olimpíadas de maio. Nuno tem 19 anos e está no 1.º ano da licenciatura em Matemática na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Estava no 8.º ano quando decidiu participar pela primeira vez nas Olimpíadas de Matemática. Disse que sim sem pensar muito, estava longe de imaginar o quanto aquela prova iria mudar a sua vida.
Bom aluno a Matemática, logo percebeu que as olimpíadas são um desafio com graus de dificuldade. Nestas competições, há duas provas realizadas em dois dias consecutivos, cada uma com três problemas ordenados por grau de complexidade. Os problemas selecionados regem-se por elevados padrões de qualidade. E isso não é simples. “Para um matemático profissional, conseguir ter um problema da sua autoria selecionado para as Olimpíadas Internacionais de Matemática é um feito comparável ao de publicar um artigo numa revista científica de topo”, explica o aluno. “As Olimpíadas de Matemática são competições de problemas desafiantes, que requerem simultaneamente uma elevada criatividade e um domínio profundo da técnica envolvida”, acrescenta.
Nas olimpíadas nacionais, antes da competição, há duas eliminatórias. A primeira, em novembro, é realizada a nível escolar. Foi esta a primeira prova de Nuno. Prova superada, aprovado para a segunda eliminatória. Sentiu que tinha passado para outro nível. “Motivado pelo apuramento, treinei afincadamente para a segunda eliminatória. Os recursos que possuía eram as provas dos anos anteriores, disponíveis online”, recorda. Voltou a ser apurado para a final nacional. Praticou, resolveu o máximo de problemas e, pela primeira vez, estava numas olimpíadas a sério. Ganhou uma medalha de ouro. “
A surpresa da medalha foi pequena, comparada com a verdadeira revelação que se me deu nesses dias. A pouco e pouco, à medida que os dias da final passavam, apercebi-me que os participantes mais velhos, bem como os nossos guias, já pareciam conhecer-se uns aos outros como velhos amigos. Revelava-se-me diante dos olhos uma comunidade desconhecida com as olimpíadas como pano de fundo. Havia pessoas que faziam matemática como desporto e que construíam por meio dela amizades eternas”, lembra.
“Fascinante comunidade”
A medalha abriu-lhe outras portas, novos mundos. Foi convidado a integrar o Projeto Delfos, escola de elite onde se faz a preparação e seleção das equipas que representam Portugal nas competições internacionais. “Fiquei assim indissociavelmente ligado a esta fascinante comunidade. E nós, novatos do 8.º ano acabados de chegar ao Delfos, rapidamente descobrimos, para nosso choque, que o treino que até então tivéramos pouco ou nada valia pelos padrões das competições internacionais”. Estavam perante os melhores dos melhores. Nuno sentiu que tinha uma longa e insegura estrada pela frente. “E então a minha vida começou”, confessa. “Crescia em mim a ambição de participar nas competições internacionais, de seguir as passadas dos meus colegas mais velhos e mais experientes, que via então como ídolos. Foi uma total libertação da vida entorpecida e sem rumo nem objetivo que conhecera até esse tempo.” Os cinco anos que se seguiram foram intensos. Participou em 54 estágios do Projeto Delfos, resolveu cerca de 200 problemas dos bancos de problemas das Olimpíadas Internacionais. E não se cansa de reviver as memórias que esta fase da sua vida lhe proporcionou.
Muito trabalho, muito treino, problemas para resolver. “A vida de um olímpico da matemática é em tudo análoga à de um atleta. A preparação para estas competições tem uma receita simples: resolver muitos, muitos problemas. Quanto mais treino é realizado, mais facilmente se têm ideias. É fundamental a um olímpico expor-se ao máximo de ideias possível. Quanto mais experiência teórica possuímos, mais facilmente a criatividade nos problemas é despertada”. Recomenda acompanhar o treino prático da resolução de problemas com a leitura dos artigos sobre a matéria que circulam na internet.
“Todo este trabalho requer um entusiasmo e um gosto profundos. Esta parece uma verdade trivial, mas o facto é que é difícil a um olímpico chegar longe no mundo das olimpíadas sem se deixar absorver profundamente pela matemática e pelos problemas.” Quando estava nas competições, os problemas matemáticos entravam-lhe no subconsciente. “A satisfação de encontrar a solução para um problema difícil não tem igual. As medalhas ganhas nas diversas olimpíadas deixam, sem dúvida, uma sensação de realização, mas que corresponde a uma minúscula fracção da felicidade que todo este treino proporciona.” “Como olímpico reformado, posso seguramente afirmar que as medalhas obtidas têm uma importância muito relativa, que em nada se compara à dos problemas resolvidos no treino, bem como, seguramente, das vivências e amizades que a experiência olímpica proporciona”, acrescenta.
Por tudo o que viveu, recomenda a participação nas olimpíadas. Por vários motivos. “As olimpíadas ensinam Matemática. Como ex-olímpico que seguiu um curso de Matemática, posso afirmar seguramente que o treino olímpico me proporcionou uma preparação inigualável para ‘o mundo dos matemáticos a sério’, mesmo em áreas que não têm qualquer relação com as abordadas nas olimpíadas.” Nas olimpíadas, há muita ambição e uma fraternidade de assinalar. E ensinam a lutar por um objetivo sem garantias de recompensa.
Ideias úteis
Alberto Cavaleiro Pacheco também tem várias medalhas nas olimpíadas de Matemática. Estava no 8.º ano quando a professora lhe perguntou se queria participar. Disse que sim. A prova correu-lhe mal, mas foi o primeiro classificado da sua escola, e passou à segunda eliminatória. Praticou com problemas de edições anteriores, no final ganhou uma medalha de bronze. “Mas isso não foi o mais importante que trouxe daquela competição em Leiria, mas sim o conhecimento de toda uma ‘comunidade’ de pessoas que adoravam Matemática e que pareciam contactar com a Matemática olímpica diariamente”, refere. Depois disso, ganhou duas medalhas de ouro, uma de prata, uma de bronze nas Olimpíadas Portuguesas de Matemática.
Mais duas medalhas de prata e duas de bronze nas Olimpíadas Paulistas. Mais uma medalha de prata, uma menção honrosa nas Olimpíadas de Maio; uma medalha de prata nas Olimpíadas de Matemática da Comunidade de Países de Língua Portuguesa. E ainda uma medalha de bronze nas Olimpíadas Iberoamericanas de Matemática. Tem 17 anos, está a terminar o 12.º ano no Colégio Paulo VI, em Gondomar, quer seguir Matemática na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto ou Matemática Aplicada e Computação no Instituto Superior Técnico. Como se faz a preparação para estas competições? Resolver problemas de olimpíadas anteriores é ponto assente. “Ao fazer isso, expomo-nos a vários tipos de problemas e ideias, o que é bastante útil se queremos ter, em prova, uma maior probabilidade de ter ideias úteis. Talento é uma coisa importante no início, mas é quase inconcebível conseguir ter sucesso sem esforço e dedicação”, refere. Defende que é mais útil gastar menos tempo a tentar decorar as coisas e mais a tentar entendê-las. “Não compreendo como se pode fazer o que quer que seja sem entender o que se está a fazer”, comenta.
O que se sente quando se ganha uma medalha nestas competições? “O significado de uma medalha varia muito consoante os objetivos, as expectativas e os resultados em si. Por vezes, encaro medalhas como ‘prémios de consolação’ quando sabia que podia ter feito melhor, mas mesmo essas têm um significado positivo. Ficar triste com uma medalha mostra-me a mim mesmo que tenho de continuar a praticar e a tentar melhorar e que nunca nos devemos contentar com o que alcançámos até ao momento. Noutras vezes, as medalhas têm um valor por si só, pela própria conquista da medalha, quando realmente consigo cumprir os meus objetivos e alcançar a medalha pretendida. Felicidade, orgulho e vontade de continuar é o que vem com a vitória”.
E para participar é preciso gostar de Matemática e de resolver problemas. “Caso contrário, não sei até que ponto vale a pena. Depois disso, basta praticarem e superarem-se a vocês mesmos, o que importa é divertirem-se com o que fazem e os resultados vêm depois”. Conselhos de aluno que conhece as competições por dentro e que quer continuar a estudar a disciplina dos números no ensino superior.
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