Crianças assistiram a mais de 84 mil casos de violência doméstica em oito anos

Abril 19, 2019 às 8:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
Etiquetas: , , ,

Notícia e imagem da SIC Notícias de 1 de abril de 2019.

As forças de segurança registaram 84.767 situações de violência doméstica que foram presenciadas por crianças ou jovens.

Mais de 84 mil situações de violência doméstica em Portugal foram presenciadas por crianças ou jovens nos últimos oito anos, revelou esta segunda-feira o especialista António Castanho, sublinhando que os números ainda estão longe da realidade.

“A violência doméstica interrompe, destrói e tem impacto na vida futura de milhares de crianças em Portugal”, alertou hoje o especialista que representa o Ministério da Administração Interna (MAI) em equipas sobre violência doméstica e na Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ), durante a cerimónia de abertura do Mês da Prevenção dos Maus Tratos na Infância, que decorreu em Lisboa por iniciativa da CNPDPCJ.

A dimensão do problema

Nos últimos oito anos “13.133 crianças e jovens foram vítimas de violência doméstica” e muitas mais assistiram a situações de violência na família, lembrou António Castanho.

“Entre janeiro de 2010 e 31 de janeiro de 2018, as forças de segurança registaram 84.767 situações de violência doméstica que foram presenciadas por crianças ou jovens”, revelou o psicólogo clínico e psicoterapeuta, acrescentando que estas situações representam 37,7% dos casos de violência doméstica.

Para António Castanho, os números “estão muito aquém da realidade”, uma vez que registam apenas as situações em que os agentes encontram crianças ou jovens quando chegam ao local. Além disso, acrescentou, os dados não incluem ainda os serviços efetuados no ano passado pela GNR.

A dimensão do problema também foi salientada pela comissária da PSP Aurora Dantier, que lembrou as queixas de violência doméstica registadas só no ano passado – 26.439 – para concluir que milhares de crianças e jovens terão assistido a agressões, tendo em conta a percentagem apresentada por António Castanho (37,7%).

Crescer com violência doméstica

Quando há violência doméstica, são raras as crianças que conseguem crescer sem assistir, sublinhou a socióloga e investigadora Zélia Barroso, lembrando o estudo em que analisou os casos de violência doméstica que durante um ano chegaram aos Institutos de Medicina Legal do Porto e de Coimbra.

Foram 1.066 mulheres vítimas e “95,3% dos filhos assistiam à violência”, recordou Zélia Barroso, explicando que as crianças “ouviam ou viam o que se passava em casa”.

Além disso, “outras 69,4% crianças também sofriam maus tratos, umas diretamente e outras quando tentavam defender as mães”, contou.

Nas consultas de pedopsiquiatria de um hospital de Lisboa Zélia Barroso apercebeu-se da ligação entre os casos de relacionamentos violentos dos pais e de crianças vitimadas: “72,5% das crianças vítimas de maus tratos tinham vivenciado violência conjugal e 70% eram vítimas de negligência combinada com abuso psicológico e físico”, contou.

“A violência na infância é muito mais do que violência física”

Foi precisamente depois de trabalhar um caso de violência doméstica que António Castanho decidiu dedicar uma atenção especial às crianças: “Em 1994 fui chamado por causa de um caso de violência doméstica e quando lá cheguei encontrei uma mãe ensanguentada e duas crianças num canto a chorar. Nunca esqueci o olhar daquelas duas crianças”, contou.

Mas, “a violência na infância é muito mais do que violência física. É violência psicológica e é não disponibilizar algo que a criança precisa: Seja educação, saúde ou atenção, que também são formas de violência”, sublinhou a secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, Ana Sofia Antunes.

“Não me parece que a sociedade tenha a perceção de como esta realidade é avassaladora”, acrescentou por seu turno a procuradora Julieta Monginho, do Tribunal de Família e Menores Cascais, alertando para o facto de “o sofrimento emocional provocado pelo mau trato persistir para o resto da vida”.

Além do trauma da exposição à violência doméstica, há o problema da transmissão intergeracional, que está cientificamente estudado.

A pedopsiquiatra Teresa Goldschmidt, diretora do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental da Infância e da Adolescência de Pediatria do Hospital de Santa Maria, lembrou que “pais que foram filhos mal-amados trazem uma bagagem emocionalmente difícil”.

Um círculo vicioso que todos os especialistas defenderam que é preciso quebrar.

Lusa

 

Alexandre teve um ataque de pânico aos 8 anos. Duarte tinha apenas 6

Abril 19, 2019 às 12:00 pm | Publicado em A criança na comunicação social | Deixe um comentário
Etiquetas: , , ,

Texto do MAGG de 8 de abril de 2019.

por Marta Gonçalves Miranda

Há cada vez mais crianças a procurar ajuda e os especialistas estão alerta. Contamos-lhe histórias impressionantes de um drama real.

Em setembro do ano passado, Alexandre estava num treino de hóquei quando começou a sentir falta de ar. O pai estava a assistir na bancada, a mãe noutra área mas também dentro do clube. Quando se aperceberam do que se estava a passar, levaram o filho imediatamente para a rua. Ajudou, mas Alexandre continuou com a estranha sensação de que não conseguia respirar bem em espaços fechados. Apesar do frio, o regresso a casa foi feito com as janelas do carro abertas. Pelo menos assim conseguia respirar.

No dia seguinte, o cenário voltou a repetir-se. Alexandre não queria entrar num restaurante, mas os pais insistiram. A incapacidade de respirar foi tão grande que saiu a correr e acabou por desmaiar na rua. Teve de ser levado para o hospital de ambulância.

Depois de muitos exames, os médicos concluíram que não havia nenhum problema físico. Aos 8 anos, Alexandre foi diagnosticado com ansiedade e ataques de pânico.

“O segundo ataque de pânico foi o pior que ele teve”, conta à MAGG a mãe, Lara Fonseca, 41 anos. “Começou a dizer que as pessoas cuspiam sangue antes de morrer — acho que deve ter visto isso num vídeo qualquer — e começou a cuspir para a mão”.

Alexandre começou a ser acompanhado por uma psiquiatra e por uma psicóloga. Os primeiros meses foram duros: a criança da Póvoa de Santa Iria não conseguia ir à escola, às vezes nem sequer sair de casa. Durante dois meses tiveram que ter as janelas sempre abertas, para ajudar Alexandre a sentir que não estava preso. Além disso, e como é habitual nos ataques de pânico, o medo de morrer ou de ficar doente eram uma constante.

“Um dia ele teve uma espécie de surto emocional em que dizia que já não tinha medo de morrer e que o que pensava mesmo era em matar-se porque não aguentava viver assim.” Aquelas palavras apanharam Lara de surpresa, mas também ao próprio Alexandre, explica a mãe, que de repente se apercebeu da gravidade do que estava a dizer.

Hoje Alexandre tem 9 anos e já vai à escola, a festas de anos e brinca com os amigos. Está a ser medicado (tinha a dopamina um bocadinho mais alta do que o normal) e continua a ser acompanhado por um psicólogo, mas as consultas já não são tão regulares e as melhoras são evidentes. Ainda só não voltou aos treinos de hóquei, contudo os especialistas asseguram que não há pressa — como foi no clube que tudo começou, um novo ataque de pânico no local pode fazer regredir tudo. Portanto, é ir com calma.

Porque é que isto aconteceu com Alexandre? Ninguém sabe explicar ao certo. “O que a psiquiatra nos disse é que ele é uma criança orquídea, como eles chamam, isto é, crianças extremamente sensíveis e que podem ser perturbadas por coisas simples”. Lara reconhece a sensibilidade do filho, bem como a fase em que tudo isto aconteceu: “É uma altura em que eles começam a ter mais consciência da morte. Às vezes ele vinha deitar-se connosco e chorava porque tinha medo que a mãe ou o pai morressem”.

“Na sua maioria, as crianças não possuem os métodos para levar a cabo a intenção de se suicidarem”

Na Clínica de Psicologia e Coaching Learn2be, os especialistas têm notado um aumento do número de famílias que procuram o serviço de psicoterapia para ajudar as suas crianças com manifestações de auto-mutilação e ideação suicida (conjunto de pensamentos recorrentes). No entanto, explica a diretora clínica Vera Ferreira, “sabe-se que, na sua maioria, as crianças não possuem os métodos para levar a cabo a intenção de se suicidarem.”

Na faixa etária de que falamos, até aos 10 anos, crianças como Alexandre que dizem que não querem viver mais estão a pedir ajuda. Estão a mostrar a sua tristeza, o seu desconforto, o seu desânimo e dificuldade em enfrentar os dias.

“É importante realçar aqui que a ideação suicida está diretamente ligada ao facto de a criança não se sentir capaz de lidar com determinada situação da sua vida e não com a vida em si. É importante desmistificar este pré-conceito e esclarecer que a criança não quer acabar com a vida, ela apenas quer acabar com o sofrimento”, continua. “Quando percebe que isso é possível, a ideação suicida desaparece.”

O facto de a criança explicar aos pais aquilo que sente, e sobretudo o desejo de acabar com o sofrimento, também é uma ajuda para os profissionais e família. “A ideação suicida é um dado conhecido pelos pais porque a própria criança verbaliza que não quer continuar a viver, o que nos dá (a nós profissionais e à família) uma margem excelente para intervir e ajudar.”

Maria Laureano, pedopsiquiatra da Unidade Psiquiátrica Privada de Coimbra, concorda com a ideia de que os pensamentos suicidários estão relacionados com a vontade de acabar com o sofrimento. Até porque os miúdos “não têm um entendimento completo do que esses atos encerram, nem compreendem a letalidade ou o fim real desses atos. Algumas crianças pensam que a morte é um estado transitório ou que é possível reverter.”

Ainda assim, não podemos excluir a possibilidade de um pensamento suicidário ser levado em frente por uma criança. “Ideias como ‘as crianças não pensam na morte, nem agem contra si com comportamentos suicidários’ são mitos. As crianças pequenas podem ter pensamentos de morte e atentar intencionalmente contra si próprias.”

Os pais e cuidadores devem estar atentos aos sintomas, e incentivar a criança a falar. “Devemos evitar atitudes que levem a criança ao silêncio, por exemplo devolver-lhe que ‘Isso são assuntos sérios, não é para brincar’ ou que não se fala disso”, continua a pedopsiquiatra. “É importante que as crianças mantenham a capacidade de falar com os pais e os adultos de confiança. Perceberem que o adulto âncora está disponível e quer ajudar (ainda que às vezes não saiba logo como), pode mudar todo o curso da história da criança.”

Duarte tinha 6 anos quando foi diagnosticado com ansiedade e ataques de pânico

“Começou de repente. Ele dizia que se estava a sentir mal, que estava a ver tudo à roda, que tinha o coração acelerado”. Com apenas 6 anos, Duarte (nome fictício) estava a transpirar das mãos, tremia e não tinha dúvidas de que ia morrer. “Mas o que é que sentes?”, perguntou a mãe, Matilde (nome fictício), operadora de call center. “O coração está muito acelerado, estou mal-disposto. Quero vomitar, estou zonzo, estou a ver tudo à roda”.

Aos 34 anos, Matilde não teve dúvidas de que era um ataque de pânico — sofrendo ela própria de ansiedade e de transtorno de pânico, era impossível não reconhecer os sintomas. A mãe tentou explicar-lhe que ia ficar tudo bem, mas não foi fácil. “Se até para nós adultos é difícil aceitar que vai ficar tudo bem, o que dizer de uma criança de 6 anos?”, pergunta-nos.

Os sintomas expressos por Duarte surgiam sobretudo antes de ir para a escola — a criança tinha acabado de entrar na primária, portanto a mãe ainda ponderou que pudesse estar a sofrer bullying. Não era verdade: estava tudo bem com os colegas, até mesmo com os professores. Com apenas 6 anos de idade, Duarte sofria mesmo de ansiedade à escola. Não era aos amigos ou aos professores, era à escola.

Não houve mais nenhuma situação na vida de Duarte que pudesse explicar o que se estava a passar, a não ser esta transição da pré-primária para a primária. “Aquela transição da pré para a primeira classe pode tê-lo assustado um bocadinho. Acho que foi mais por aí”. Ainda assim, explica Matilde, nem sempre há uma causa lógica para o surgimento deste transtorno — pode ser algo tão simples como um distúrbio químico no cérebro.

A situação começou a piorar. Da ansiedade à escola passou para os centros comerciais, restaurantes ou até o café. A ideia de estar rodeado por muitas pessoas deixava-o assustado, tanto que evitava ir a parques infantis que estivessem cheios de miúdos.

Explicar o que é ansiedade a uma criança de 6 anos não é fácil. Neste caso, porém, o facto de Matilde saber exatamente o que o filho estava a sentir, ajudou — fazia respirações com ele, assegurava-lhe que ia ficar tudo bem. “Dava-lhe água, molhava-lhe a nuca, os punhos… Tudo estratégias que nós utilizamos.” Duarte também começou a fazer psicoterapia. “Também esteve no psiquiatra mas não lhe quiseram dar medicação porque ainda era muito pequenino — tentámos com a psicoterapia e conseguimos.”

Hoje Duarte tem 8 anos e já tem as suas estratégias para lidar com a ansiedade. Quando começa a ficar ansioso, vai à casa de banho e molha os pulsos e a nuca. Além disso, anda sempre com um saco de papel para fazer as respirações em picos de ansiedade.

Há cada vez mais crianças a sofrer de ansiedade e ataques de pânico?

“Os quadros de ansiedade continuam a ser aqueles que mais recebemos na equipa infantojuvenil da Oficina de Psicologia, particularmente ansiedade generalizada e ansiedade social”, explica Inês Afonso Marques, psicóloga clínica e coordenadora da área infantojuvenil da Oficina de Psicologia. Para Maria Laureano, pedopsiquiatra da Unidade Psiquiátrica Privada de Coimbra, também não há dúvidas de que “os números aumentaram grandemente.”

Mas é preciso compreender que há também uma maior consciência de que às vezes é preciso pedir ajuda. Se há algumas décadas era impensável para alguns pais levar uma criança pequena ao psicólogo ou psiquiatra, hoje já não é assim.

“Da minha casuística posso dizer que há mais crianças e adolescentes a tomarem a iniciativa de pedirem aos pais para marcarem uma consulta no psicólogo em comparação há 7 ou 8 anos”, explica a psicóloga. No caso das crianças com 10 anos ou menos, acrescenta a pedopsiquiatra, e estando ainda tão dependentes dos cuidadores, diminuiu-se o estigma. “Não raras vezes se ouvia ‘É tão pequenino/a para ir ao psiquiatra’”.

O que é um ataque de ansiedade?

“O conceito ‘ataque de ansiedade’ não expressa um quadro nosológico. É um termo mais ou menos convencionado para descrever uma intensificação de medo e preocupação, habitualmente em resposta a um gatilho específico (uma discussão, um teste, um momento de antecipação de algo que se receia…) e que pode ser acompanhado de desconforto físico como pressão no peito, coração acelerado, dor de barriga, etc. Por comparação com um ataque de pânico é algo descrito como menos avassalador”, explica Inês Afonso Marques, da Oficina de Psicologia.

E um ataque de pânico?

“Um ataque de pânico surge ‘do nada’, sem ser uma resposta a um determinado stressor. Um ataque de pânico é um período abrupto de medo ou desconforto intensos que atinge um pico em minutos e durante e qual ocorrem vários sintomas físicos e cognitivos (palpitações, ritmo cardíaco acelerado, suores, sensação de dificuldade em respirar, desconforto ou dor no peito, náuseas sensação de tontura, cabeça vazia ou desmaio, formigueiros, medo de perder o controlo ou de “enlouquecer”, medo de morrer. Estes sintomas podem passar despercebidos aos adultos pela dificuldade das crianças em verbalizarem aquilo que pensam e sentem e pelos adolescentes poderem estar menos disponíveis para falar abertamente de algo que sentem como avassalador e assustador.”

Ansiedade e ataques de pânico. Sinais de alerta

— Incapacidade para lidar com problemas e atividades quotidianas, desinteresse em brincar, desinteresse por atividades que anteriormente estimulavam a criança positivamente;
— Ansiedade excessiva;
— Alteração do sono (insónia, pesadelos);
— Sentimentos de tristeza;
— Variação ponderal acentuada;
— Comportamentos antissociais repetidos (episódios de agressividade com os amigos ou mesmo adultos);
— Isolamento mantido;
— Comportamentos agressivos dirigidos a si próprio (bater na cabeça, arranhar-se);
— Verbalizações de querer sair de casa, de que sente que ninguém a estima, de que nunca faz nada bem (nas verbalizações o mais importante não é totalmente o conteúdo proferido, mas a tonalidade negativista da criança);
— Queixas somáticas (dores de barriga, dores de cabeça, tonturas, náuseas, etc., sem causa médica associada;
— Verbalizações fora do habitual (exemplo: não me apetece ir para a escola; ficas comigo até adormecer; podemos antes ficar em casa, sinto-me mal mas não sei porquê;
— Oscilações de apetite.

 

 

Conferência Europeia “Educação para o Desenvolvimento Sustentável” 17-18 maio em Belas

Abril 19, 2019 às 6:00 am | Publicado em Uncategorized | Deixe um comentário
Etiquetas: , , , ,

mais informações:

https://omepportugal.wordpress.com/


Entries e comentários feeds.