Dependência digital. “Internet promove isolamento das crianças”

Fevereiro 1, 2024 às 6:00 am | Publicado em Estudos sobre a Criança, O IAC na comunicação social | Deixe um comentário
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Notícia da Sábado de 23 de janeiro de 2024.

Andreia Antunes

Um estudo do ICAD deixa um alerta para a dependência da Internet e redes sociais entre os jovens. Melanie Tavares, do Instituto de Apoio à Criança, aconselha que os pais controlem o uso de ecrãs pelos filhos o mais cedo possível.

A Internet e as redes sociais são um refúgio para os jovens procurarem o alívio da frustração e da ansiedade, revelou o estudo Scroll. Logo existo!: Comportamentos aditivos no uso dos ecrãs. E Melanie Tavares, coordenadora dos setores de humanização dos serviços do atendimento à criança e dos setores da atividade lúdica do Instituto de Apoio à Criança (IAC), deixa outro aviso à SÁBADO: “A Internet está mais acessível às crianças, e aquilo que sentimos é que promove o isolamento.” 

O estudo apresentado esta terça-feira, 23, no Instituto para os Comportamentos Aditivos e as Dependências (ICAD), confirma esse isolamento: “O consumo descontrolado da oferta digital, Internet e redes sociais pode contribuir para um estado de alienação social, desenvolvendo um padrão de comportamento cujas relações online se constituem como a zona de conforto”. A investigação abrangeu 1.704 inquiridos, maiores de 16 anos e até aos 74. 

“Ao longo dos últimos anos vimos mudanças”, refere Melanie Tavares. Com o aumento do uso da Internet e das redes sociais, as relações de sociabilidade entre as pessoas são afetadas.

“Assistimos à mudança do comportamento com o uso cada vez mais precoce dos telemóveis”, frisa a perita. Durante a pandemia, o “WhatsApp promoveu o contacto social, mas quando acabou o confinamento, [as pessoas] mantiveram os hábitos e o conforto de não socializar.”

E quanto mais novas são as crianças que entram no mundo digital, mais dependência se pode criar, porque são afetadas funções cognitivas que têm de ser exercitadas na infância. “Estas crianças não estão a ser ‘treinadas’ para estar umas com as outras, não treinam as competências sociais”, explica Melanie Tavares, acrescentando que ficam “limitadas porque não estão umas com as outras”. 

Melanie Tavares destaca ainda que nas crianças mais pequenas, “afeta o brincar, o contexto lúdico e as competências não formais”, atividades que levam as crianças a aprender valores e comportamentos sociais. Já nos adolescentes, fica comprometida “a relação com os pais e até com os amigos, devido às inseguranças que advêm das alterações físicas e emocionais”.

A dificuldade na regulação do sono é outro problema: “As crianças adquirem dificuldade na atenção e em memorizar por não reporem o sono.”

Os pais desempenham um papel importante sobre a dependência que as crianças podem ter dos ecrãs mas, em muitos casos, não se apercebem dos problemas dos filhos. “O uso excessivo deve-se muitas vezes aos pais”, afirma Melanie Tavares. “Não tiram tempo para as crianças, promovendo assim o uso do digital como ferramenta para a sua substituição.” Um dos desafios mais comuns entre as famílias passa por “desligar os ecrãs a horas de descanso: os pais têm dificuldade em impor os limites e as regras”.

As crianças e adolescentes ganham assim dificuldade em estar em grupo e criam inseguranças sobre a sua própria imagem, por estarem habituados a refugiar-se num perfil no meio digital.

Como contornar o problema?

Dialogar com as crianças é uma das maneiras mais simples de os pais lidarem com o vício dos ecrãs. “Se a criança ou jovem não tem diálogo, refugia-se”, alerta Melanie Tavares, acrescentando que os pais até podem negociar as horas de ir para a cama ou o cumprimento das regras com os filhos.

A coordenadora ainda sugere momentos em família, como um “simples jogo de tabuleiro”, para dar a volta à dependência dos ecrãs: aliás, a 20 e 21 de abril, irá decorrer o 3º Festival de Jogos de Tabuleiro para Famílias organizado pelo IAC, que promove a “dinâmica da competição saudável” e “atividades de interesse e que envolvem as crianças e jovens”.

As diferentes dependências

O estudo do ICAD revela que uma em cada 100 pessoas apresenta dependência de internet e das redes sociais. Há pessoas na faixa etária dos 24 ou menos anos que têm um grau de “dependência da Internet ou das redes sociais”, chegando mesmo a sentir-se irritados e ansiosos quando o equipamento eletrónico ou a falta de Internet não lhes permite aceder ao online. Dentro desta faixa etária, 73,6% usam as redes sociais para aliviar a mente e combater até estados de ansiedade e depressão.

Os estímulos provocados pelas respostas aos emails e as mensagens nas várias plataformas, assim como publicar fotografias e receber comentários, entram no quadro da dependência digital. “Ainda que os dados quantitativos obtidos não configurem um quadro dramático, sustentam um cenário de elevada preocupação sobre a diversidade de estímulos tecnológicos que potenciam o alhear da vida física em benefício da vida digital”, alerta o estudo.

Já outros casos revelaram náusea digital – sensação de interação com ambientes digitais que provoca desorientação ou vertigem –, nomofobia – um sentimento de falta quando o telemóvel não está junto da pessoa –, e até mesmo a síndrome do “toque fantasma” – que consiste em sentir o telemóvel vibrar mesmo quando tal não aconteceu.

A perda de noção do tempo, a ansiedade com as falhas de Internet e privação de acesso do online e o facto de quererem obter satisfação com as redes sociais são fatores agravados pela necessidade de estar online para manter o equilíbrio psicológico, aponta o estudo: “Como a vida na internet e nas redes sociais está em constante movimento, alimenta-se uma necessidade de acompanhar ao máximo o fluir dessa vida, resultando em momentos de prazer e de descontrolo no tempo de utilização.”

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