Agredidas, acorrentadas, violadas e obrigadas a mendigar. Mais de 100 mil crianças “talibé” sujeitas a abusos no Senegal
Julho 1, 2019 às 12:00 pm | Publicado em Relatório | Deixe um comentárioEtiquetas: Abuso Sexual de Crianças, África, Castigos Físicos, Crianças em perigo, Crianças em Risco, Human Rights Watch, Islamismo, Maus Tratos e Negligência, Mendicidade forçada, Relatório, Senegal, Trabalho Escravo
Notícia do Sapo 24 de 11 de junho de 2019.
Mais de 100 mil crianças “talibé” continuam sujeitas a mendicidade forçada, castigos físicos, abusos sexuais e negligência no Senegal, segundo um relatório da Human Rights Watch, que denuncia a inércia das autoridades perante o problema.
O relatório da Human Rights Watch (HRW) e da Plataforma para a Proteção dos Direitos Humanos (PPDH, na sigla em inglês) do Senegal, que analisa 2017 e 2018, fala de “níveis alarmantes” de maus tratos físicos, abusos sexuais, negligência e mendicidade forçada destas crianças em dezenas de escolas corânicas no país.
As organizações documentaram, durante este período, a morte de 16 crianças vítimas de castigos físicos, negligência e ameaças por parte de professores de escolas corânicas residenciais, conhecidas como daaras.
O documento dá ainda conta de abusos contra estas crianças em 8 das 14 regiões do Senegal, incluindo 61 casos de abusos físicos, 15 casos de violações ou tentativa de violação e 14 casos de crianças fechadas e acorrentadas.
A mendicidade forçada e a negligência são generalizadas entre estas crianças, segundo o relatório.
“As crianças ‘talibé’ estão a encher as ruas, sofrem abusos horrendos e morrem desses abusos e por negligência”, apontou Corinne Dufka, diretora associada da HRW para África.
“As autoridades senegalesas dizem que estão comprometidas em proteger as crianças e em acabar com a mendicidade forçada, então porque é que tantas ‘daraas’ abusivas, exploradoras e perigosas continuam abertas?”, questionou.
A situação das crianças “talibé” no Senegal tinha já sido denunciada pela HRW num outro relatório, em 2010, em que a organização instava o Governo a regulamentar as daaras, mas volvidos estes anos a situação pouco ou nada se alterou.
Para a elaboração deste novo relatório, de 71 páginas e intitulado “Enorme sofrimento: Abusos graves contra crianças talibé no Senegal, 2017-2018″, as duas organizações visitaram quatro regiões do país, entrevistaram 150 pessoas, incluindo 88 atuais e antigos “talibé”, 23 professores e dezenas de trabalhadores sociais, especialistas em proteção de crianças e membros da administração senegalesa.
Os responsáveis pelo relatório observaram e falaram com grupos de crianças – algumas com 5 anos – que pediam nas ruas de Dacar, Saint-Louis, Diourbel, Touba e Louga.
Visitaram 22 escolas residências e 13 centros e abrigos, tendo encontrado inúmeras crianças “talibé” que descreveram práticas de abusos sexuais, violações e mendicidade forçada.
O relatório reconhece que há muitos professores nas escolas corânicas no Senegal que respeitam os direitos dos “talibés”, mas aponta que muitos outros continuam a abusar e a negligenciar estas crianças.
A Human Rights Watch estima que mais de 100 mil crianças sejam forçadas pelos seus professores a pedir diariamente dinheiro, comida, arroz ou açúcar, sendo obrigados a cumprir quotas diárias sob pena de serem espancados.
Dos 88 talibés entrevistados, 63 disseram ser obrigados a conseguir uma quota diária entre 100 a 1,250 francos CFA (entre 0.30 e 2 euros).
Muitas destas crianças tinham cicatrizes e feridas visíveis.
“Batiam-nos a toda a hora se não memorizávamos os versos do Corão ou se não trazíamos dinheiro. Batem-te até pensares que vais morrer”, contou uma criança de nove anos, que fugiu de uma daara em Dacar em 2018 para escapar aos abusos.
Outras crianças contaram que foram amarradas ou acorrentadas em espaços que pareciam celas, por vezes durante semanas e meses, como castigo.
“Se tentávamos fugir, acorrentavam-nos pelas duas pernas para não nos conseguirmos mexer”, disse outra criança de 13 anos, que escapou de uma daara em Diourbel.
Um rapaz de 15 anos, que fugiu de uma daara em Diourbel, disse ter testemunhado abusos sexuais de “talibés” mais jovens por colegas mais velhos.
Muitas das crianças acompanhadas nas ruas e nas 22 daaras visitadas pelas organizações tinham infeções e estavam doentes, mas não recebiam tratamento.
Entre as escolas visitadas, 13 forneciam pouca ou nenhuma comida às crianças, que estavam alojadas em edifícios decrépitos e abandonados, sem latrinas, sabão ou redes para se protegerem dos mosquitos transmissores da malária.
Os responsáveis pelo relatório identificaram ainda indícios de tráfico humano envolvendo crianças “talibé”, incluindo transporte ilegal de crianças de região para região e mesmo cruzando a fronteira do país, crianças abandonadas em cidades distantes e outras que acabam nas ruas depois de terem fugido dos abusadores.
Algumas famílias perpetuam estas práticas ao devolverem repetidamente as crianças às daaras onde sofreram abusos.
A HRW e a PPDH reconhecem que o Senegal tem leis robustas contra o abuso de crianças e o tráfico humano, mas adianta que as medidas tomadas para proteger os “talibés” e responsabilizar os seus abusadores são “limitadas”.
Por isso, na sequência do relatório, as organizações vão propor ao Governo do Senegal um roteiro para proteger as crianças “talibé” e promover uma mudança duradoura.
“Com este novo mandato, o Presidente [Macky] Sall tem uma oportunidade de ter um impacto duradouro na vida de milhares de crianças, protegendo os “talibés” da exploração e acabando com os abusos nas daaras”, disse Mamadou Wane, presidente da PPDH.
Mais informações na notícia da Human Rights Watch:
7.000 recém-nascidos morrem todos os dias, apesar da redução constante da mortalidade de menores de cinco anos, diz um novo relatório
Outubro 21, 2017 às 1:00 pm | Publicado em Relatório | Deixe um comentárioEtiquetas: África, Ásia, Estatística, Europa, Mortalidade Infantil, Recém-Nascido, Relatório, Taxa de Mortalidade Infantil, UNICEF
Comunicado de imprensa da http://www.unicef.pt/ de 19 de outubro de 2017.
7.000 recém-nascidos morrem todos os dias, apesar da redução constante da mortalidade de menores de cinco anos, diz um novo relatório
Mantendo-se as tendências actuais, 30 milhões de recém-nascidos morrerão nos primeiros 28 dias de vida entre 2017 e 2030
NOVA IORQUE/GENEBRA/WASHINGTON DC, 19 de Outubro de 2017 – Todos os dias em 2016, 15.000 crianças morreram antes do seu quinto aniversário, das quais 46% – isto é, 7.000 bebés – morreram nos primeiros 28 dias de vida, segundo um novo relatório das Nações Unidas.
Levels and Trends in Child Mortality (Níveis e tendências na mortalidade infantil 2017) revela que apesar do número de crianças que morrem antes de completar os cinco anos nunca ter sido tão baixo – 5,6 milhões em 2016, comparando com 9.9 milhões em 2000 – a proporção de mortes nos primeiros 28 dias de vida aumentou de 41% para 46% no mesmo espaço de tempo.
“As vidas de 50 milhões de crianças com menos de cinco anos foram salvas desde 2000, o que atesta o sério compromisso feito pelos governos e parceiros para o desenvolvimento, para pôr fim às mortes evitáveis de crianças”, afirmou Stefan Swartling Peterson, chefe de saúde da UNICEF. “Mas se não fizermos mais para impedir que bebés morram no dia em que nascem, ou nos dias posteriores, este progresso permanecerá incompleto. Dispomos do conhecimento e da tecnologia necessários – apenas precisamos de os fazer chegar às regiões onde são mais precisos.”
Mantendo-se as tendências actuais, 60 milhões de crianças morrerão antes do seu quinto aniversário entre 2017 e 2030, metade das quais serão recém-nascidos, segundo o relatório publicado pela UNICEF, a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Banco Mundial e a Divisão de População do Departamento de Assuntos Económicos e Sociais das Nações Unidas (UNDESA) – que compõem o Grupo Interinstitucional sobre a Estimativa da Mortalidade em Crianças (Inter-agency Group for Child Mortality Estimation [UG-IME]).
A maioria das mortes de recém-nascidos ocorreram em duas regiões: Ásia meridional (39%) e África subsariana (38%). Cinco países contabilizaram metade de todas as mortes de recém-nascidos: Índia (24%), Paquistão (10%), Nigéria (9%), República Democrática do Congo (4%) e Etiópia (3%).
“Para alcançarmos uma cobertura universal de saúde e garantir que mais recém-nascidos sobrevivam e prosperem, devemos chegar às famílias marginalizadas”, afirma a Dra. Flavia Bustreo, Directora-Geral Adjunta para Saúde da Família, da Mulher e da Criança na OMS. “Para evitar doenças, as famílias precisam de meios financeiros, que as suas vozes sejam ouvidas e de ter acesso a cuidados de qualidade. Melhorar a qualidade dos serviços e a resposta atempada durante e após o nascimento devem ser prioritários.”
De acordo com o relatório, muitas vidas podem ser salvas mediante a redução das desigualdades no mundo. Se todos os países tivessem alcançado a taxa média de mortalidade dos países de elevado rendimento, 87% das mortes de crianças menores de cinco anos poderiam ter sido evitadas e quase 5 milhões de vidas poderiam ter sido salvas em 2016.
“Em 2017, é impensável que a gravidez e o parto continuem a colocar a vida das mulheres em risco e que 7.000 recém-nascidos continuem a morrer todos os dias”, afirma Tim Evans, Director Sénior da Saúde, Nutrição e População no Grupo do Banco Mundial. “A melhor forma de medir o sucesso da cobertura universal de saúde não consiste apenas na facilidade do acesso de todas as mães aos cuidados de saúde, mas também pela qualidade do atendimento e pelo baixo custo dos serviços, para que possam garantir uma vida saudável e produtiva aos seus filhos e à sua família. Estamos empenhados em aumentar o nosso financiamento para responder às necessidades dos países nesta área, nomeadamente através de projectos inovadores como o Mecanismo de Financiamento Mundial.”
A pneumonia e a diarreia estão no topo da lista de doenças infecciosas que custaram a vida a milhões de crianças com menos de cinco anos em todo o mundo, tendo causado 16% e 8% dessas mortes, respectivamente. As complicações relacionadas com o parto prematuro e as complicações durante o trabalho de parto ou nascimento foram responsáveis por 30% das mortes neonatais em 2016. Além dos 5,6 milhões de mortes de crianças menores de cinco anos, registam-se ainda 2,6 milhões casos de nados-mortos por ano, a maioria dos quais evitável.
Podemos pôr fim às mortes infantis evitáveis mediante a melhoria do acesso a profissionais de saúde qualificados durante a gravidez e no momento do parto; e do acesso a intervenções que salvam vidas, como a vacinação, o aleitamento materno e medicamentos de baixo custo, bem como acesso a água e saneamento, que estão actualmente fora do alcance das comunidades mais pobres do mundo.
Pela primeira vez, foram incluídos no relatório os dados sobre a mortalidade de crianças entre 5 e 14 anos, destacando outras causas de morte, como acidentes e lesões. Quase um milhão de crianças entre 5 e 14 anos morreram em 2016.
“Este novo relatório destaca os notáveis progressos alcançados desde 2000 na redução da taxa de mortalidade dos menores de cinco anos”, disse o Sr. Zhenmin Liu, Secretário-Geral Adjunto da ONU para Assuntos Económicos e Sociais. “Apesar destes progressos, continuam a registar-se grandes desigualdades na sobrevivência infantil entre regiões e países, particularmente na África subsariana. No entanto, intervenções simples e económicas, realizadas antes, durante e imediatamente após o nascimento, são suficientes para evitar muitas das mortes que ocorrem. Reduzir as desigualdades e ajudar os recém-nascidos, as crianças e as mães mais vulneráveis é essencial se quisermos alcançar o Objectivo de Desenvolvimento Sustentável de pôr fim às mortes evitáveis e assegurar que ninguém fica para trás. ”
O relatório também destaca que:
- Na África subsariana, estima-se que uma em cada 36 crianças morre durante o primeiro mês de vida, enquanto nos países de rendimento elevado o rácio é de 1 em cada 333;
- A menos que o progresso seja acelerado, mais de 60 países não cumprirão o Objectivo de Desenvolvimento Sustentável de pôr fim às mortes evitáveis de recém-nascidos em 2030, e metade destes não atingirão a meta de 12 mortes por cada 1.000 nascidos vivos até 2050. Mais de 80% das mortes neonatais em 2016 ocorreram nesses países.
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Acerca do Grupo Interinstitucional sobre a Estimativa da Mortalidade Infantil (Inter-agency Group for Child Mortality Estimation [UG-IME])
O UN-IGME foi criado em 2004 com o objectivo de partilhar dados sobre a mortalidade infantil, uniformizar estimativas dentro do sistema das Nações Unidas, melhorar os métodos para as estimativas de relatórios sobre a mortalidade infantil sobre progressos alcançados em matéria de sobrevivência infantil, e fortalecer as capacidades dos países no que diz respeito à produção de estimativas atempadas e devidamente levantadas sobre mortalidade infantil.
O UN-IGME é liderado pela UNICEF e inclui a Organização Mundial da Saúde, o Grupo do Banco Mundial e a Divisão de População do Departamento de Assuntos Económicos e Sociais das Nações Unidas. Para mais informação, por favor visite http://www.childmortality.org
Rota da Líbia é um inferno de violência para as crianças migrantes
Março 4, 2017 às 9:00 am | Publicado em Relatório | Deixe um comentárioEtiquetas: Abuso Sexual de Crianças, África, África-subsaariana, Crianças Migrantes, Crianças Não Acompanhadas, Crianças Refugiadas, Escravatura infantil, Estatística, Líbia, Relatório, Tráfico de Crianças, UNICEF, Violência Contra Crianças
Notícia do https://www.publico.pt/ de 28 de fevereiro de 2017.
Descarregar o relatório citado na notícia e documentos multimédia no link:
https://www.unicef.org/media/media_94941.html

Mamahba, um rapaz guineense de 17 anos, coberto com um cobertor térmico depois de uma operação de salvamento no Mediterrâneo, perto da costa líbia, no início de Fevereiro Reuters/GIORGOS MOUTAFIS
Muitas são espancadas e violadas ao longo da viagem em busca de refúgio na Europa. Nos centros de detenção, a violência continua, alerta a UNICEF.
Kamis tem nove anos. Partiu com a sua mãe da Nigéria, atravessou o deserto de carro e foi resgatada no mar quando o bote em que seguia estava à deriva antes de ser confinada a um centro de detenção na cidade líbia de Sabratha, onde não havia praticamente água. “Eles costumavam bater-nos todos os dias. Batiam nos bebés, nas crianças e nos adultos”, contou Kamis. “Aquele lugar era muito triste. Não há lá nada.” Aza, a mãe, pagou 1400 dólares pela sua viagem e a dos filhos. Garante que desconhecia os riscos envolvidos, mas que voltar para trás não era uma opção. Enquanto esperavam no bote só pensava: “Fiz tudo isto pelos meus filhos e pelo seu futuro, não quero perdê-los. […] Se for eu, não faz mal [morrer], mas eles não.”
As denúncias das organizações são uma constante e o trabalho dos técnicos e voluntários no terreno incansável, mas os resultados continuam a ser diminutos. Para os milhares de crianças que atravessam o Mediterrâneo central todos os anos – em 2016 foram 26 mil, o dobro do ano anterior e nove em cada dez sem a companhia de um adulto – a viagem do país onde nasceram em direcção à Europa está carregada de perigos. E não é só no mar.
O mais recente relatório da Unicef, o Fundo das Nações Unidas para a Infância, divulgado esta terça-feira, concentra-se sobretudo nas dificuldades e privações que as crianças enfrentam em terra, em particular na Líbia, menos documentadas pelas agências, jornais e televisões internacionais.
O documento – A Deadly Journey for Children: The Central Mediterranean Migrantion Route – dá conta, por vezes em detalhes perturbadores, de histórias de violência, escravatura e abusos sexuais de que são alvo estas crianças extremamente vulneráveis que procuram chegar a Itália. Histórias que, na maioria das vezes, não denunciam por medo serem presas ou deportadas.
Por trás deste receio está também o facto de muitos dos agressores usarem uniforme. A avaliar pelos testemunhos das 122 mulheres e crianças ouvidas (82 mulheres e 40 menores), as fronteiras são particularmente perigosas. “A violência sexual está espalhada e é sistemática em zonas de cruzamento e em checkpoints”, garante o relatório.
Epicentro da violência
Pela sua posição geográfica – tem uma ampla costa mediterrânica e faz fronteira com a Tunísia, a Argélia, o Níger, o Chade, o Sudão e o Egipto – a Líbia tem servido de destino a muitos dos que procuram desesperadamente chegar à Europa e, por isso, tem vindo a transformar-se no epicentro desta violência extrema.
“Quase metade das mulheres e crianças entrevistadas [ao longo da preparação do relatório] foi vítima de abuso sexual durante a migração”, lê-se no documento. “E com frequência mais do que uma vez em mais do que um local.” Aproximadamente um terço admitiu ter sido alvo de algum tipo de violência na Líbia.
“Muitas destas crianças foram brutalizadas, violadas e mortas nesta rota”, disse à televisão pública britânica Justin Forsyth, vice-director executivo da Unicef, que neste novo relatório mapeia 34 centros de detenção na Líbia, três deles no interior do país, em zonas de deserto, a maioria geridos pelas entidades governamentais encarregues do combate às migrações ilegais. Nestes locais que podem chegar a ter sete mil pessoas a falta de água, de comida e de cuidados médicos é permanente, embora a situação seja ainda mais grave nos centros entregues a grupos armados e cujo número se desconhece.
Nestes centros entregues às milícias, os abusos são ainda mais recorrentes e o acesso que a eles têm a Unicef e outras organizações de auxílio aos migrantes e refugiados é muitíssimo mais diminuto.
Em 2016, mais de 180 mil pessoas passaram da Líbia para Itália, entre elas quase 26 mil crianças, a maioria a viajar sozinha. E a tendência é para que este número cresça, explica o vice-director executivo à BBC, porque a situação em países como a Eritreia, a Nigéria e a Gâmbia está a piorar.
Issaa, 14 anos, é dos que tentaram a sua sorte sem que um adulto o acompanhasse. “O meu pai juntou dinheiro para a minha viagem, desejou-me boa sorte e depois deixou-me ir”, disse aos técnicos encarregues do inquérito da Unicef. Isto aconteceu há dois anos e meio e este rapaz do Níger está hoje num centro líbio. Tudo o que Issaa quer é “atravessar o mar” e procurar trabalho para poder ajudar os cinco irmãos que ficaram em casa.
Nas mãos dos traficantes
Grande parte desta violência começa nos traficantes a quem os migrantes pagam para poder atravessar o deserto ou cruzar o Mediterrâneo. O negócio está entregue a criminosos que muitas vezes obrigam mulheres e crianças a prostituírem-se para pagarem as suas dívidas. Muitas das mulheres que chegam à Europa para entrar em redes de exploração sexual passam pela Líbia, diz o relatório. A situação instável em que o país vive torna muito difícil controlar este sistema que perpetua vários tipos de abuso e que parece estar completamente fora de controlo.
A Unicef está agora a pressionar todos os países, sobretudo a Líbia e os vizinhos, para que criem corredores de segurança para estas crianças em marcha, para que combatam o tráfico de seres humanos e para que promovam o registo de nascimentos nos seus países e a reunificação das famílias de migrantes e refugiados. Na agenda para a acção deste fundo das Nações Unidas está ainda a garantia de condições de acesso à educação e à saúde, o combate à xenofobia e à descriminação em países de trânsito ou de destino e, objectivo maior, a adopção de medidas capazes de minimizar as causas subjacentes aos movimentos de pessoas em larga escala.
“Quer sejam migrantes ou refugiados, vamos tratá-los como crianças”, pediu Forsyth em declarações à BBC.
Os números causam impacto. Em 2016, pelo menos 4579 pessoas perderam a vida entre a Líbia e Itália, na mais mortífera das rotas marítimas que ligam África à Europa. Mais de 700 eram crianças, lê-se no comunicado que a organização das Nações Unidas fez chegar às redacções.
“O percurso do Norte de África para a Europa através do Mediterrâneo central é uma das mais perigosas rotas migratórias para as crianças e as mulheres”, diz Afshan Khan, directora regional da Unicef e coordenadora especial para os refugiados e para a resposta à crise na Europa. “A rota é maioritariamente controlada por contrabandistas, traficantes e outros indivíduos que procuram aproveitar-se das crianças e mulheres desesperadas que apenas buscam refúgio ou uma vida melhor.”
De acordo com este que é o mais recente relatório da Unicef, três quartos dos entrevistados com menos de 18 anos (o que inclui até crianças com cinco anos, como Victor, que acabou por reencontrar a mãe que já julgava perdida) admitiram ter sido alvo de algum tipo de violência, assédio ou agressão por parte de adultos.
O documento mostra ainda que os migrantes da África subsariana têm tendência a ser mais mal tratados do que aqueles que são do Egipto ou do Médio Oriente. Will é um desses migrantes. Depois de perder os pais num naufrágio, o rapaz de oito anos nascido no Níger está hoje detido na Líbia: “Nós queríamos ir para Itália. Estávamos num barco. Passado um bocado o barco começou a meter água e pouco depois afundou”, recorda. “Houve um rapaz que sobreviveu e eu agarrei-me a ele durante horas. Ele salvou-me. Mas o meu pai e a minha mãe morreram. Nunca mais os vi.”
O que acontecerá a Will, Victor e Issaa? O que acontecerá às suas famílias? Kamis, a menina de nove anos com que começa este artigo, quer ser médica. Antes de saírem de casa a mãe disse-lhe: “Não te preocupes, quando chegarmos a Itália serás médica.” Aza ainda não pôde cumprir a promessa de Europa que fez à filha. Estão as duas num centro de detenção na Líbia.
Ser criança em África ainda é sinónimo de ser (muito) pobre e ter poucos estudos
Julho 18, 2016 às 12:00 pm | Publicado em Relatório | Deixe um comentárioEtiquetas: África, Crianças, Exclusão Escolar, Mortalidade Infantil, pobreza infantil, Pobreza multidimensional, Relatório, Taxa de Mortalidade Infantil, UNICEF
Notícia do Observador de 28 de junho de 2016.
Quem nasce, já nasce pobre e, por norma, o casamento está mais próximo do que a escola. O relatório da UNICEF não é animador e fala de milhões de crianças com um futuro de poucas oportunidades.
A pobreza continua a ser um atestado colado às crianças na África subsariana mesmo antes de nascerem, a escola é mais ilusão do que realidade e as gravidezes acontecem pouco depois da primeira década de vida. A perspetiva pouco otimista é da UNICEF e está inscrita no relatório anual “A Situação Mundial da Infância 2016”, divulgado esta terça-feira pelo órgão da ONU.
O estudo aponta grandes dificuldades para as crianças mais desfavorecidas, sobretudo na África subsariana e no sul da Ásia. Na primeira região, 2 em cada 3 crianças vivem em pobreza multidimensional (nutrição, saúde e habitação), o que corresponde a 247 milhões de crianças. Cerca de 60 por cento das raparigas entre os 20 e os 24 anos, das franjas mais pobres da população, tiveram menos de quatro anos de escolaridade, aponta o relatório.
A organização destaca os progressos mundiais feitos na baixa da taxa de mortalidade infantil, na luta contra a pobreza e pela educação — a taxa de mortalidade de crianças com menos de cinco anos baixou para menos de metade desde 1990, por exemplo. Mas o progresso não chegou a todos os países da mesma forma.
A pobreza em África continua a ser um fardo que pesa em tudo o resto. “As crianças mais pobres têm duas vezes mais probabilidades de morrer antes dos 5 anos e de sofrer de subnutrição crónica do que as crianças mais ricas”, lê-se no documento. As mais ricas também têm mais acesso à escola e ficam por lá mais tempo. A falta de estudos, por outro lado, condiciona as vidas seguintes: “As crianças filhas de mães não escolarizadas têm três vezes mais probabilidades de morrer antes dos 5 anos do que as crianças de mães que frequentaram o ensino secundário”, exemplificam. Os casamentos infantis vêm por arrasto — as meninas de famílias mais desfavorecidas têm duas vezes e meia mais probabilidade de casar na infância do que as de famílias com mais posses.
A ideia é que estes números não se transformem em bola de neve, até porque há objetivos a cumprir até 2030. O cronómetro começou a contar em setembro de 2015, quando foram definidos 17 novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para cumprir em 15 anos. “Acabar com a Pobreza” e “Atingir a Igualdade de Género” são dois dos 17 objetivos a que se comprometeram os países da ONU.
Morte de adolescentes devido à sida triplicou nos últimos 15 anos
Novembro 30, 2015 às 12:00 pm | Publicado em Estudos sobre a Criança | Deixe um comentárioEtiquetas: Adolescentes, África, Crianças, Estatística, HIV/SIDA, Jovens, Mortalidade, Mundo, Prevalência, Relatório, UNICEF
Notícia da RTP Notícias de 27 de novembro de 2015.
mais informações no comunicado de imprensa da Unicef:
O número de mortes de adolescentes devido à SIDA triplicou desde 2000
O número de mortes de adolescentes devido à sida triplicou nos últimos 15 anos, segundo um relatório do Fundo da ONU para a Infância (UNICEF), que é hoje apresentado na África do Sul.
Segundo o relatório, intitulado Atualização das Estatísticas sobre Crianças Adolescentes e Sida, aquela doença é a “principal causa de morte entre adolescentes em África e a segunda principal causa de morte entre adolescentes no mundo”.
“De entre as populações afetadas pelo VIH (Vírus da Imunodeficiência Humana), o grupo dos adolescentes é o único no qual os números da mortalidade não estão a diminuir”, refere.
O documento salienta também que a África subsaariana é a “região com maior prevalência” e que as “raparigas são de longe as mais afetadas, representando sete em cada dez novas infeções na faixa que têm entre 15 e 19 anos”.
“É crucial que os jovens seropositivos tenham acesso a tratamento, cuidados e apoio”, afirmou Craig McClure, responsável pelos programas globais da UNICEF para o VIH/Sida.
O relatório revela também que dos “2,6 milhões de crianças menores de 15 anos que vivem com VIH, apenas uma em cada três está a receber tratamento”.
As novas estatísticas demonstram que a maior parte dos adolescentes que morrem de doenças relacionadas com a Sida foram infetados há 10 ou 15 anos.
“Essas crianças sobreviveram até à adolescência, por vezes sem conhecer o seu estado em termos de HIV”, salienta.
Em 2000, refere o documento, foram “evitadas perto de 1.3 milhões de novas infeções em crianças” devido aos avanços realizados na prevenção e transmissão de mãe para filho.
O Dia Mundial de Luta Contra a Sida assinala-se a 01 de dezembro.
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